CONTRIBUIÇÕES
DA FILOSOFIA GRECO-ROMANA PARA A PSICOLOGIA
INTRODUÇÃO - Foi na Grécia antiga que ocorreram os primeiros passos sobre
a questão psicológica, a partir das investigações filosóficas que levaram o
homem a observar a si próprio, buscando a compreensão do seu próprio ser e sua
relação com o mundo.
Mais
precisamente, as primeiras incursões nas questões psicológicas ocorreram com o
nascimento da Filosofia ocidental por volta do início do séc. V A.C., com o
significado de amizade pelo saber e definindo o pensamento racional por
característica. Tal fato se prende ao trabalho de sistematização e consolidação
do pensamento primitivo e antigo da humanidade, efetuado, inicialmente pelos
pré-socráticos e, posteriormente pela condução filosófica socrática e
pós-socrática.
Historicamente,
o surgimento da Filosofia na Grécia antiga foi motivado pelas descobertas
marítimas, pelo registro abstrato das ideias com a invenção da escrita
alfabética, pela abstração do tempo com a invenção do calendário, pela forma de
troca surgida com a invenção da moeda, com a ambientação estabelecida com o
surgimento da vida urbana. Com a ética da Polis que propiciou a invenção da
política surgindo às leis, o espaço público e a estimulação das ideias num
pensamento coletivo.
É
com essa filosofia que se define as bases e fundamentos conceituais acerca da
ética, da pedagogia, da racionalidade, da técnica, da ciência, da arte, da
cronologia, da política e da física e, inclusive, da psicologia.
É
em razão dessa contribuição da Filosofia antiga, notadamente a greco-romana,
que o presente estudo se realiza, procurando destacar de que forma os
pensadores e filósofos da antiguidade, propuseram, por meio de suas
investigações, as bases para a ciência psicológica.
Justifica-se
a realização do presente trabalho a necessidade de se encontrar as raízes do
pensamento humano, especificamente das questões psicológicas que transitam na
existência humana, bem como pela determinação de pensadores que buscando
respostas para as questões mais íntimas do indivíduo, se voltaram para a
necessidade da compreensão da vida e do mundo.
Objetiva,
portanto, por meio de uma revisão da literatura destacar as contribuições
formuladas pelos filósofos da antiguidade grega e helenística para a formação
da ciência psicológica.
A
metodologia aplicada no desenvolvimento da presente pesquisa de natureza
exploratória, qualitativa e descritiva, embasada numa revisão bibliográfica e
documental para alcance da dimensão da temática proposta.
Na
primeira parte do trabalho procurou-se evidenciar a fonte do pensamento
psicológico por meio da identificação de como se processou o processo
instaurador da filosofia, procedendo a uma revisão que sinalize os antecedentes
ocorridos na antiguidade até o florescimento dos primeiros pensamentos
filosóficos destinados às questões psicológicas. Em abordar-se-á a filosofia
pré-socrática, socrática e pós-socrática até o advento da filosofia helenística
e pagã com a penetração do Cristianismo.
A PSICOLOGIA NA FILOSOFIA GREGA:
Antecedentes históricos - O
começo da filosofia e da ciência teórica no mundo, conforme registrado por
Souza (1978), Russel (2002) e Aranha e Martins (1994), é marcado pelo confronto
de duas correntes de pensamento sinalizadas pela oposição Oriente-Grécia.
De
um lado, o pensamento orientalista reivindicando para si a criação da sabedoria
que foi herdada e desenvolvida posteriormente pelos gregos; de outro, o
pensamento ocidentalista propondo o nascimento da filosofia e da ciência
teórica entre os gregos.
Registram
Padovani e Castagnola (1978, p. 26) que:
É comum, pois, que os historiadores da Filosofia iniciem sua
História sempre por Tales de Mileto. Não que eles ignorem a longa pré-história,
o extensíssimo período pré-filosófico no qual germinava a Filosofia para empós
abrolhar, depois de lenta fermentação intelectual, que vem desde o fundo dos
séculos. Mas é que os documentos epigráficos das civilizações mesopotâmicas v.
g. são mui raros e de acesso mui difícil. E porque a documentação sobre os
povos selvagem nada nos dizem sobre o que tenha sido a Grécia primitiva.
Sob
esse aspecto, os autores designam nos contextos históricos como antecedentes
filosóficos o pensamento indiano e bramânico e suas ligações religiosas com o
jainismo, budismo, até a introdução do pensamento grego.
Também
Myers
(2006), Chauí (2002) e Chauí (2002b) admitem a
existência de conduções filosóficas e de sabedoria entre os chineses, hindus,
japoneses, árabes, persas, hebreus, africanos e índios.
No
dizer de Myers
(2006), Buda na Índia observou como as sensações e percepções se uniam para
formar ideias; Confúcio na China destacou o poder das ideias e de uma mente
esclarecida; as escrituras hebraicas de Israel antigo já falavam da relação
mente e emoção ao corpo e que sentiam com as entranhas e pensavam com o
coração, entre outras.
Tais conduções dão conta que havia antes dos
gregos um pensamento filosófico, porém disperso, fato esse registrado por Reali
e Anteseri (1990) e Marcondes (1998), assinalando que foram os gregos quem
consolidaram o que havia de pulverizado entre os eventos míticos e poéticos.
Discussões
à parte, o que se pode retirar das controvérsias da pesquisa histórica, fica
registrado que para o Ocidente a Filosofia e a Ciência teórica surgem na Grécia
antiga no período alexandrino ou helenístico por volta dos séculos V e IV a. C.
Noutra
observação, Bock (1991) registra que no período compreendido a partir do século
VII A.C., deu-se o momento áureo do pensamento humano entre os gregos. Tal fato
se deu com o desenvolvimento ocorrido na Grécia, possibilitando que esse povo
tivesse entre as suas ocupações, as discussões filosóficas e artísticas.
É
o que reforça Souza (1978, p, 6) ao mencionar que:
Embora o início histórico da filosofia e da ciência teórica
ainda contenha pontos controversos e continue um problema aberto – na
dependência inclusive de novas descobertas arqueológicas -, a grande maioria
dos historiadores tende hoje a admitir que somente com os gregos começa a
audácia e a aventura expressas numa teoria. Às conquistas esparsas e
assistemáticas da ciência empírica e pragmática dos orientais, os gregos do
séc. VI a. C., contrapõem a busca de uma unidade de compreensão racional, que
organiza, integra e dinamiza os conhecimentos.
Em
conformidade com o autor mencionado, é exatamente nesse período que se
desenvolve unidade de uma compreensão racional, resultado de um longo processo
cultural que convergiu com o desenvolvimento social, econômico, político e
geográfico que proporcionaram o nascimento do que se convenciona chamar de
milagre grego.
Assim
sendo, assinala Chauí (2002, p. 20) que: “A Filosofia, entendida como aspiração
ao conhecimento racional, lógico e sistemático da realidade natural e humana,
da origem das coisas do mundo e de suas transformações e do próprio pensamento,
é um fato tipicamente grego”.
Também
assinalam Castro e Landeira-Fernandez (2011, p. 8) que: “[...] a cultura grega
antiga serve como um marco na fundação do pensamento ocidental. É a partir
desta civilização que surgem observações mais sistemáticas sobre estrutura e
funcionamento do corpo, da mente e a relação entre estas duas entidades”.
O
cenário desse período era envolto num clima de predominância politeísta com
vigência da mitologia grega. E é exatamente aí que se posiciona por uma
consolidação do pensamento filosófico e científico teórico pelos grandes
pensadores gregos. Além disso, é nesse período que aparece o termo grego psyché embasando a significação da
Psicologia, como razão da alma, permitindo o entendimento do seu significado
como estudo da alma. Merece, então, destacar com base em Hirschberger (1965),
Bock (1991), Frias (2004) e Gusmão (2014) que, entre os gregos, o termo alma
traduzia a concepção da parte interior e imaterial do homem, abarcando seus
sentimentos, pensamentos, emoções, percepções, sensações, racionalidade,
desejo, entre outras. Com isso, há de se registrar que a mitologia grega,
conforme Cotrim (2006) vai contribuir com a Psicologia de diversas formas,
entre elas, a saga de Édipo, encenada pelo dramaturgo grego Sófocles (496-406
A.C.), embasando, por exemplo, a ideia de Complexo de Édipo do psicanalista
austríaco Sigmund Freud (1856-1939), ao reelaborar o mito grego ao
transformá-lo em elemento fundamental de sua teoria.
Cortes
(2014) vai encontrar o mesmo embasamento nessa mitologia nas fontes simbólicas
da Psicologia Analítica de Carl Jung, bem como Berbel (2014) vai desenvolver
estudos psicológicos acerca dos mitos gregos como arquetípicos.
Já
Braz (2005)
vai desenvolver estudos psicológicos acerca do amor efetuando uma releitura da
mitologia greco-romana.
Na
literatura se encontra inumeráveis estudos acadêmicos voltados para a
identificação de conduções psicológicas flagradas nas narrativas oriundas da mitologia
grega.
A
esse respeito acrescenta Chauí (2002, p. 27) que:
[...] os dois maiores formadores da cultura grega antiga, os
poetas Homero e Hesíodo, encontraram nos mitos e nas religiões dos povos
orientais, bem como nas culturas que precederam a grega, os elementos para
elaborar a mitologia grega, que, depois, seria transformada racionalmente pelos
filósofos.
Com
isso, observa a autora que o poeta era tido na época como um escolhido dos
deuses, criando mitos como o de Eros, Prometeu, Pandora, entre outros, que vão
metaforizar a realidade e perdurar por milênios até o presente, por denotarem
os anseios e desejos humanos.
Também
registra Souza (1978, p. 8) que: [...] em poesia o homem grego canta o declínio
das arcaicas formas de viver ou pensar, enquanto prepara o futuro advento da
era científica e filosófica que a Grécia conhecerá a partir do séc. VI a. C.”.
Contudo,
numa revisão aprofundada da literatura encontram-se registros de que os temas
que envolvem a mente e o corpo surgem no cenário antigo por meio do pensamento
filosófico que emergiu entre os gregos antigos por volta de 1.200 e 800 A.C., a
partir da obra homérica.
Foi
com o conhecimento das obras A Ilíada e A Odisseia do poeta grego Homero (928
A.C.-898 A.C.), datadas entre o final do século VIII A.C., e inicio do século
VII A.C., que se sabe acerca dos costumes religiosos, práticas políticas,
hábitos sociais e crenças por meio das narrativas que envolvem a estrutura
cultural e social daquela época, definindo os conceitos de saúde e enfermidade,
bem como da relação da alma, mente e corpo.
Nesse
sentido, para Silva (2007, p. 122), a literatura homérica representa:
A voz de Homero não é a voz particular de um
poeta, mas a voz de uma cultura, de uma sociedade, diferente da voz do Deus
cristão apreendida como única e definitiva, logo inalterável.
Enfim, nesse aspecto, consideramos Homero como o inaugurador da tradição épica
da qual participamos. Falar dele corresponde a tentar demonstrar, em palavras,
o que vem a ser o momento inaugural da nossa literatura.
Em
vista disso, a Ilíada, segundo Schuler (2004), além de ser um poema épico,
narrando os acontecimentos que se sucederam durante a Guerra de Tróia, bem como
os relatos acerca do comportamento, da vida cotidiana e da cultura grega.
Já
a Odisseia, no dizer de Carlier (2008), retrata o retorno dos gregos de Tróia
para a Grécia, narrando às emoções, comportamento, pensamentos, atitudes e
ações de Odisseu no enfrentamento dos revezes por vários anos de luta para
retornar à sua cidade natal. Além de Homero, conforme Chauí (2002) e Chauí
(2002b), outros poetas contribuíram para o desenvolvimento do pensamento
filosófico grego, a exemplo de Arquíloco, Teógnis e Píndaro, exprimindo
sentimentos de que o mundo é tecido por repetições e mudanças intermináveis.
Merece
destaque a observação de Souza (1978) e Castro e Landeira-Fernandez (2011) de
que o corpo era visto nessa época como um aglomerado de membros que se
representavam pelo ritmo dos seus movimentos e pela força da musculatura. Em
virtude disso, observa-se que os gregos desse período não possuíam uma
concepção unitária da vida psíquica, contudo, a obra homérica está permeada de
sinalizações da vida mental humana, por meio dos afetos e sentimentos,
pensamentos, ânimos, emoções, comportamentos, intuições, suposições,
conhecimentos, inteligência, ímpetos e arrebatamentos, sem distinção entre os
órgãos humanos e o processo psíquico. Dessa forma, em conformidade com Castro e
Landeira-Fernandez (2011, p. 7): as questões que envolviam os debates acerca de
corpo-mente ocorreram desde a antiguidade, assinalando que:
Essas questões, fundamentais nas ciências da mente
contemporâneas, estiveram também presentes nas primeiras organizações antigas
humanas. Desde os primórdios da humanidade e em diferentes civilizações antigas,
como Egito, Mesopotâmia, Índia e China, observa-se a construção de diversas
perspectivas acerca da relação mente-corpo, contemporâneas entre si e que
refletem uma preocupação fundamental em compreender como ocorre a relação entre
nossos corpos e os fenômenos mentais.E de maneira similar às civilizações
supracitadas, nota-se também na Grécia antiga a existência de tais
preocupações. Na verdade, nenhuma outra cultura antiga deixou marcas ainda tão
presentes como a civilização grega. Pode-se afirmar que a base de todo
pensamento ocidental moderno encontra suas origens nesta civilização.
Tem-se,
pois, que a preocupação com o corpo e a mente não era privilégios dos
pensadores gregos, mas de outras regiões do planeta. Entretanto, assinala Bock
(1991, p. 22) que “É entre os filósofos gregos que surge a primeira tentativa
de sistematizar uma Psicologia”, sendo tal fato reiterado por Atkinson et al
(2011).
A PSICOLOGIA NA FILOSOFIA GREGA: A filosofia pré-socrática - O primeiro período do pensamento
grego, segundo Padovani e Castagnola (1978, p. 99), é identificado como aquele
denominado por período naturalista que compreende as escolas jônica e eleata,
sendo este período o de “[...] nascente especulação dos filósofos é
instintivamente voltada para o mundo exterior, julgando-se encontrar aí também
o período unitário de todas as coisas; e toma, outrossim, a denominação
cronológica de período pré-socrático [...]”.
ESCOLA JÔNICA - A primeira
escola que se tem notícia, conforme Banes (2003), é a que se encontrava na
cidade de Mileto, na Ásia Menor, denominada de escola Jônica.
Cotrim
(2006), Gomes (2014) e Machado (2014) assinalam que os Jônios foram os primeiros filósofos gregos. Surgiram eles nas
florescentes colônias gregas do litoral da Ásia Menor, a Jônia, e, em seguida,
da Itália meridional, a Magna Grécia, quando surgiu o denominado milagre grego
com o desenvolvimento das artes e política, a exemplo da democracia e da
ciência, bem como do teatro, da música, da literatura e aperfeiçoamento das
artes plásticas.
No dizer de
Banes (2003) e Bunet (1994), que foi com essa escola que surgiu a exigência
racional, embasada na doutrina filosófica do Hilozoísmo que defendia a ideia de
que toda matéria universal é viva, identificando o cosmo como um organismo integrado
material que possui as características da consciência, sensibilidade ou
animação.
Foi nessa
escola que surge o nome de Tales de
Mileto (640 a 584 A.C.), considerado como o primeiro filósofo ocidental,
fundador da Escola Jônica e considerado um dos sete sábios da Grécia, além de
filósofo, astrônomo, matemático, político e comerciante. Ele, segundo
Hirschberger (1965), é reconhecido como o herdeiro das inquietações e
conhecimento dos antigos egípcios e babilônios.
A
filosofia de Tales de Mileto, segundo Marcondes (1998), tentou corrigir as
incorreções e falhas das filosofias anteriores, quando procurou realizar
estudos sobre as funções dos órgãos sensoriais, os processos cerebrais e
perturbações nos casos de lesões do cérebro.
Foi
ele, conforme Pessanha (1978), quem admitiu ser a água a origem do universo, a
substância primordial, trazendo por consequência a primeira visão de
distanciamento entre as percepções e o pensamento racional. O seu teorema e a
sua cosmologia está baseado no arché,
ou seja, um só princípio, uma só coisa fundamental.
Inaugurando
o período naturalista entre os jônios, Weate (1999), surge Anaximandro de
Mileto (610 A.C.- 547 A.C.), defendendo a infinitude dos mundos numa perpétua inter-relação,
identificando apeíron como o infinito
em movimento perpétuo. Defendia também que os opostos são reciprocamente
pagadores das injustiças cometidas, garantindo o processo de compensação dos
excessos. O pensar para esse filósofo grego é poematizar, sendo o ser a maneira
originária precedente da poesia, quando a linguagem se forma e atinge sua
essência, uma vez que, para ele, a linguagem pode expressar tudo que se pensa
claramente.
Também
participou do período naturalista dos jônios, o filósofo Anaxímenes (588-524 A.C.), que era
discípulo de Tales e defendia ser o ar a substância primária, o elemento básico
físico e psíquico. Ele, segundo Bunet
(1994), atribuiu vida à
matéria e identificando a divindade com o elemento primitivo gerador dos seres,
refutando ao mesmo tempo Tales e Anaximandro, afirmando que todas as coisas
seriam produzidas através do duplo processo mecânico de rarefação e condensação
do ar infinito, entendendo que a natureza do ar originário era antes
determinada de maneira estranha, negativa, com relação à consciência. Tanto sua
realidade, a água, ou também o ar, enquanto o infinito é um alem da
consciência. Tanto Anaximandro quanto Anaxímenes atuaram como doxógrafos, ou
seja, eles recolhiam e transcreviam as opiniões dos filósofos precedentes.
A ESCOLA PITAGÓRICA - A
escola pitagórica foi fundada pelo filósofo Pitágoras de Samos (571 A.C. – 497
A.C.), na colônia grega de Crotona, na Itália, Magna Grécia, depois transferida
para Metaponto. Foi vista, no dizer de Spinelli (2014), como uma associação que
reunia ciência, ética e política, com base nas ideias órficas e na concepção de
que tudo é regulado segundo relações numéricas,
fazendo conexão com práticas ascéticas e abstinências na sua confraria. Ele
criou um sistema global de doutrinas, cuja finalidade era a de descobrir a harmonia
que preside à constituição do cosmos e traçar, de acordo com ela, as regras da
vida individual e do governo das cidades. No seu entendimento, as categorias
biológicas (macho/fêmea), as oposições cosmológicas (à direita/ à esquerda –
relativas ao movimento das estrelas fixas e ao dos astros errantes), as éticas
(bem/mal), entre outras, seriam, na verdade, variações da oposição fundamental
que determinaria a própria existência das unidades numéricas: a oposição do
limite (peras) e do ilimitado (apeíron). O pensamento pitagórico
exerceu profunda influência no platonismo e persiste no tempo até os dias
atuais com tendências místico-religiosas e científico-racionais.
Atribui-se
ao filósofo grego Pitágoras a invenção da palavra filosofia e, segundo Chauí (2002, p. 19) ele: “[...] teria afirmado que a
sabedoria plena e completa pertence aos deuses, mas que os homens podem
desejá-la ou amá-la tornando-se filósofos”, sendo, então, aquele que é movido
pelo desejo de observar, contemplar, julgar e avaliar as coisas, as ações, a
vida, pelo desejo de saber.
A
MEDICINA GREGA - A medicina na Grécia
era sacerdotal e, conforme Gomes (2014), “[...] Procurava-se
a cura para a doença através da magia, poções benfazejas, feitiços, e vários
tipos de aplicações e cirurgias”.
É nesse
período que surge o filósofo e médico Alcmeón de Crotona (500 A.C. – 450 A.C.)
que foi o primeiro a considerar que o cérebro era o centro de todas as
sensações e sede da razão, da cognição e da sensação.
A esse respeito, assinala Gomes (2014, p.
18) que:
Foi Alcméon de Crotona, na Itália, em torno do século V a. C., o
primeiro médico a basear seus conhecimentos sobre o corpo em observações
objetivas. Ele organizou uma escola de medicina em sua cidade para substituir a
medicina religiosa e mística por uma medicina racional. Alcméon acreditava que
a relação entre saúde e doença estava no equilíbrio ou desequilíbrio dos
sistemas corporais.
Em virtude disso, em conformidade com os
estudos realizados por Reale (2002) e Frias (2004), foi esse médico e filósofo
que influenciou Hipócrates, ao defender que o cérebro era o criador da mente
humana, fazendo distinções entre os seres humanos e os animais, atribuindo ao
homem ser o único animal a compreender, uma vez que os outros animais apenas
percebiam.
Além disso, registra Reale (2002) que
Alcmeón foi responsável pela suposição de que a percepção e a compreensão são
processos distintos, propondo a existência de canais sensoriais que
proporcionavam que as sensações chegassem até o cérebro, bem como foi ele quem
apresentou os nervos ópticos como conectando os olhos ao cérebro e propôs a
primeira doutrina médica do ocidente na relação entre doença e saúde.
O sucessor de Alcmeón foi Hipócrates (460- 377 a. C.) que, segundo Gomes (2014), iniciou suas
atividades médicas na tradição religiosa, contudo as substituiu,
posteriormente, por uma medicina racional, influenciado pelos filósofos de
então, ou seja, dos jônios e pitagóricos.
A medicina de Hipócrates, segundo Gomes
(2014, p. 23):
[...] baseava-se numa teoria dos humores, na qual o ser humano era descrito
como formando um todo composto de quatro partes independentes que eram os
quatro humores: o sangue, a fleuma (chamada também linfa ou pituíta), a bílis
amarela, a bílis negra ou atrabílis, cada uma das quais relacionada a um órgão
particular: o coração, o cérebro, o fígado e o baço. A saúde seria o resultado
do equilíbrio dos humores. A medicina de Hipócrates assinalou o desempenho do
cérebro no organismo e o reconheceu como a sede da inteligência. Também descreve
as ramificações do cérebro com toda s as partes do corpo e o modo como recebe
as informações dos diversos canais dos sentidos
Tem-se,
portanto, que Hipócrates desenvolveu a arte da medicina,
considerando o cérebro o centro da razão, afora outras especulações sobre a
relação entre o corpo e a mente.
Registram
Castro e Landeira-Fernandez (2011) que o conhecimento do Corpus
Hippocraticum reuniu um conjunto de textos médicos, traziam as formas de
pensar, além de discorrer sobre embriologia, fisiologia, patologia geral e
ginecologia. Trata, também, acerca de distúrbios de movimento, incluindo tipos
de paralisias, distúrbios na fala, uso de trepanação no tratamento de lesões
cranianas, apresentando a doutrina humoral, segundo a qual, o corpo é composto
por quatro humores: sangue, flegma, bile amarela e bile negra.
Observa-se, conforme anotado por Atkinson
et al (2011, p. 5) que Hipócrates
[...] tinha
profundo interesse na psicologia, o estudo das funções do organismo vivo e suas
partes. Ele fez muitas observações importantes sobre como o cérebro controla
vários órgãos do corpo. Essas observações prepararam as bases para o se tornou
a perspectiva biológica na psicologia.
Tem-se, portanto, que para Hipócrates o
cérebro é a sede do julgamento, das emoções e de todas as atividades do
intelecto, assim como a causa dos transtornos neurológicos, tais como espasmos,
convulsões e desordem da inteligência. Para ele a saúde estaria associada com a
perfeita justa proporção destes humores, tanto qualitativa quanto
quantitativamente, sendo resultado do isolamento de um dos humores em
alguma região do corpo, desequilibrando seu funcionamento.
A
ESCOLA DE ÉFESO – A escola de Éfeso surge com Heráclito (576-480 A.C.), cognominado Skoteinós, o Obscuro, com a concepção do mundo em movimento e considerando o
fogo a essência do mundo e agente de mudanças.
No dizer
de Marcondes (1998), por seu caráter altivo, desdenhoso e misantropo o fez
desprezar a plebe, os filósofos do seu tempo, poetas e religiões, tornando-se um
crítico implacável do seu tempo contra todas as ideias. Todavia, tratou em suas
investigações acerca da percepção do sono, a lucidez, pensamento e
conhecimento, bem como de aspectos biológicos, físicos, psicológicos, políticos
e morais, além da astronomia.
Registra
Banes (2003) que para ele a razão era tida como logos, ou seja, a unidade profunda que as oposições aparentes ocultam
e sugerem por meio dos contrários, em todos os níveis da realidade, e que
seriam aspectos inerentes a essa unidade, sendo, pois o vir a ser o elemento primordial, o perpétuo fluxo, a continuidade,
tornando-se o precursor da dialética. Assim, defendia que as mudanças são a essência das
coisas, sendo, para ele, a vida cambiante e que o movimento é a essência da
evolução.
ESCOLA ATOMISTA - Essa escola foi influenciada pela escola naturalista
desenvolvida pelo filósofo, poeta e médico Empédocles de Agrigento (495 - 435
A.C.) que foi um dos que estudaram os processos cognitivos no corpo. Para ele a água, a terra, o fogo e o ar eram os quatro
elementos primordiais, defendendo o amor e o ódio como os princípios
cosmogônicos, influenciando sobremaneira a visão médica a respeito dos
entendimentos acerca da saúde e da enfermidade.
Encontra-se
em Russel (2002) que ele também se debruçou sobre a fisiologia dos fenômenos
sensoriais, entendendo que a percepção se deve à capacidade dos poros
sensoriais captarem as emanações dos elementos primordiais identificados pelos
objetos. A percepção visual se dava pela capacidade de seleção dos poros da
visão, causando sensações de cores e luzes para percepção dos objetos,
influenciando, assim, o pensamento da fisiologia sensorial. Para ele o sangue
era sumamente importante para a produção dos pensamentos, uma vez que estes
dependem da similaridade, identificando o pensar com o mesmo sentido de
perceber. Para ele o pensamento se produz com a sensação, bem
como todos os animais têm pensamentos, além de considerar que a inteligência
cresce de acordo com os dados sensoriais do tempo presente. Sua filosofia estabeleceu um compromisso entre a doutrina
eleática e o mundo dos sentidos, substituindo a busca dos
jônicos de um único princípio das coisas para a totalidade da interpretação do
universo nos quatro elementos. Entretanto,
assinala Russel que a escola atomista surgiu no Iluminismo grego e teve como
principal representante o filósofo e escritor Demócrito de Abdera (430-370 a. C.), que possuía o pensamento a partir da generalidade
física de Leucipo, restabelecendo a importância do particular, que influenciou
o indutivismo de Francis Bacon, defendendo a ideia das partículas indivisíveis,
denominada por ele de átomos, explicando as percepções sensoriais ao postular
que todas as variedades de matéria resultam da combinação de átomos de quatro
elementos: terra, ar, fogo e água.
É com
Demócrito que, segundo Souza (1978), surge o mecanicismo que distinguia dois
tipos de conhecimento: o bastardo, que seria o conhecimento sensível a exprimir
as disposições do sujeito antes da realidade objetiva; e o conhecimento
legítimo, aquele que é a compreensão racional da organização interna das
coisas. Assim, sua obra trata desde a Filosofia, passando por problemas da
matemática, medicina, arte e estudos linguísticos, psicologia, metafísica e
religião, embasando-se na intuição e na lógica, sendo, pois, o continuador dos
antigos fisiocratas, contudo admitia um conhecimento da realidade absoluta, por
meio da intelecção, refutando assim o relativismo cético de Protágoras. Pela
sensação, o Homem obtinha o conhecimento relativo da realidade, sempre
imperfeito e muitas vezes pessoal; mas, pela intelecção, e portanto, pelo
pensamento, podia obter o conhecimento completo e perfeito. Sua teoria da
percepção, ou melhor, sua gnosiologia, pois na realidade se trata de todo o
mecanismo do conhecimento, não deixa dúvidas a respeito dessa posição. Para ele
tudo se constitui de átomos, de maneira que o próprio pensamento não é outra
coisa senão movimento atômico.
ELEATISMO OU
ESCOLA DE ELEIA - O poeta, matemático e
filósofo Parmênides de Eléia (530 A.C. - 460 A.C.), inaugura no período pré-socrático o pensamento
metafísico, entendendo o mundo dos sentidos como ilusório. Segundo anotado por
Weate (1999), defendia ele que os sentidos são
limitados não revelando o mundo imutável, distinguindo dois tipos de
conhecimento: o epistemológico, racional ou verdadeiro, e da opinião, ou doxa. Com isso, ele distingue o
inteligível do sensível, opondo-se aos princípios numéricos dos pitagóricos, o
imobilismo heracliteano e toda a filosofia jônica. Foi ele quem primeiro expôs
o princípio de identidade e que para conhecer e entender os conteúdos das
coisas se faz necessário pensar, considerando que conhecer o ser é conhecer a verdade, distinguindo a ciência como aquela
construída na razão e que o ser depende do sentido, entendendo que para
alcançar a verdade deverá se recorrer à razão, nunca aos dados empíricos.
Considerava que a realidade só podia ser entendida através do pensamento e que
o verdadeiro conhecimento requer que se desvencilhe dos sentidos, uma vez que,
para ele, o verdadeiro não é percebido sensorialmente, mas pela razão e
pensamento. Enfim, a sua teoria enfatiza que só existe o que pode ser pensado,
a mente é a criadora de todas as coisas.
Zenão de
Eleia (495 A.C. - 430 A.C.) foi discípulo
de Parmênides e criou a dialética com o sentido de argumentação erística ou
combativa, cultuando um raciocínio metafísico, especulativo, sob o aspecto
dialético objetivo. Com isso aborda acerca do pensamento, raciocínio e
inteligência, para formar o amálgama das suas ideias e por meio dos seus
argumentos.
A ESCOLA
SOFISTA - A sofística, conforme Padovani
e Castagnola (1978), inaugura o segundo período do
pensamento grego conhecido como sistemático, ocorrido por volta do séc. IV a.
C., caracterizando-se como o aquele em que o espírito e o homem, a moral e a
gnosiologia passam a vigorar pelas ideias dos pensadores.
Segundo
Cotrim (2006, p. 91):
As lições dos sofistas tinham como objetivo, portanto, o desenvolvimento
do poder de argumentação, da habilidade retórica, do conhecimento de doutrinas
divergentes. Eles transmitiram, enfim, todo um jogo de palavras, raciocínios e
concepções que seria utilizado na arte de convencer as pessoas, driblando as
teses dos adversários.
A
figura mais importante dessa escola é Protágoras de Abdera (490
- 415 A.C.), que se dedicou à
descoberta do fundamento de todas as coisas, por meio de uma justificativa
lógica e pelo questionamento da capacidade humana de conhecer a verdade e a lei
moral. Desenvolveu estudos sobre a sensação e suas variações, bem como a
relatividade do conhecimento.
É
a partir do pensamento dos filósofos do Sofismo que se tem a mais ampla
concepção da educação, tida como Paidéia,
modelando a educação humana com a finalidade superando os privilégios de
acessibilidade somente aos que possuíam sangue divino, como também a educação
profissional que era vitalícia de pai pra filho, procurando impor a concepção
total do homem, colocando o saber como a poderosa força espiritual para a
formação dos homens. Estava embasada no poder da persuasão, da eloquência, da
retórica, ensinando-se conteúdo enciclopédico que envolvia todo saber e a
cultura com fins práticos. Encontra-se, portanto, que o objetivo da educação sofista era a formação do espírito, encerrando uma
extraordinária multiplicidade de processos e de métodos, tornando-se, com isso,
fundadores da ciência da educação, ao estabelecerem os fundamentos da
pedagogia. Merece, assim, registrar que o sistema pedagógico estruturado pelos
sofistas para a educação superior é seguida até a atualidade no mundo
civilizado.
Por todo
exposto, observou que a filosofia pré-socrática, conforme Atkinson et al
(2011), Castro e Landeira-Fernandez (2011) e
Gomes (2014b), discutiu a forma como o homem percebe e ver o mundo, sendo,
pois, seus ensinamentos usados pela medicina baseada nas observações acerca da
saúde, enfermidade e fisiologia humana, sistematizando um conhecimento sobre o
corpo e sua relação com a mente, explorando ao mesmo tempo os aspectos
biológicos, psicológicos por meio da filosofia que abordava questões sobre a
localização do corpo e a atividade cognitiva. Foram esses filósofos que
contribuíram para romper com a visão religiosa e mítica predominante na época,
adotando uma forma de pensar racional e científica.
Tem-se,
portanto, que os filósofos pré-socráticos demonstraram sua preocupação em
efetivamente tratar acerca da definição do relacionamento entre o homem e o
mundo por meio da percepção, este identificado como um dos processos
psicológicos básicos. Além disso, foi nesse período que se deu a especulação
sobre os processos cerebrais, as funções sensoriais e as perturbações
acarretadas por lesões cerebrais.
O
PENSAMENTO SOCRÁTICO - A Psicologia ganhou consistência com o filósofo grego
Sócrates (469-399 A.C.), quando passou a se preocupar com a relação entre o
homem e os animais, postulando ser a razão a principal característica humana,
permitindo a sua sobreposição sobre os instintos e a irracionalidade. Foi com
isso, segundo Aristófanes (1980), Xenofonte (1980) e Pessanha (1980), que
ocorreu a sistematização filosófica que permitiu que surgissem as primeiras
teorias da consciência. Com isso, ao valorizar o pensamento sofista, Sócrates
definiu que a razão é a peculiaridade ou essência do ser humano, abrindo assim
o caminho para exploração da investigação psicológica. Daí, segundo Gomes (2014),
esse filosofo destacou que a principal característica do ser humano é a razão,
uma vez que por ela é que se pode sobrepor ao instinto.
O método
socrático, segundo Pessanha (1980), mantinha as mutações corroboradas pelo
fluxo perpétuo das coisas e nas variações sensitivas nos indivíduos que se
transformam ao longo da vida, substituindo o objeto da ciência do sensível para
o inteligível por meio de um processo dialético indutivo que comparava a
espécie, as diferenças, as qualidades e peculiaridades humanas, remontando o
individuo à noção universal. Adotou o diálogo como forma de instrução,
recorrendo-se à indução párea definição geral do objeto em estudo, denominando
esse processo pedagógico de maiêutica com o significado de parturição das
ideias por meio de engenhosa obstetrícia do espírito.
A sua
filosofia é caracterizada pela introspecção e a sua psicologia foi professada
ao distinguir as ordens do conhecimento em intelectual e sensitivo,
identificando a vontade com a inteligência. Com isso é considerado o fundador
da ciência em geral, limitando-se a sua filosofia à gnosiologia e à ética.
O PENSAMENTO
DE PLATÃO E ARISTÓTELES- Com o filósofo grego Platão (427-347 A.C.), então discípulo
de Sócrates, ocorreu à definição da razão localizada no próprio corpo humano,
mais precisamente na cabeça onde se localiza a alma humana e que a medula
corresponderia à ligação do corpo à alma, sendo esta, portanto, separada do
corpo. Entendia esse filósofo, segundo Zingano (2014), que a matéria ou corpo
humano quando morria, ocorria o seu desaparecimento, enquanto a alma se
tornaria livre e ocuparia outro corpo. Ele estudou os estados caracterizados
como mania e sua discussão
sobre as doenças da alma, entendendo
que alma era imortal e concebida separadamente do corpo.
Em
sua obra Timeu, Platão demonstrou em sua obra possuir conhecimento das
obras hipocráticas, adotando o modelo da medicina para o desenvolvimento de
certas ideias filosóficas. É, no dizer de Zingano (2014), a obra responsável
por levar até a Idade Média as principais ideias pré-socráticas e hipocráticas
referentes ao cérebro, ao corpo e, de forma geral, ao universo. Ao tomar
posição claramente cefalocentrista, Platão favoreceu a divulgação de tal visão
com seu prestígio.
Tanto
Sócrates como Platão, segundo Myers (2006), viam a mente como algo separado
do corpo e que continuava existindo após a morte, contudo enfatizavam as
predisposições genéticas inatas e a gramática intuitiva como o conhecimento já
existente em cada um dos seres humanos, contribuindo para a visão psicológica.
Já
o filósofo grego Aristóteles (384-322 A.C.), era discípulo de Platão e
contribuiu de forma inovadora para a Psicologia com suas postulações acerca da
alma e do corpo, defendendo que os mesmos estavam ligados e não poderiam ser
dissociados. Para ele, a psyché deve
ser entendida como o princípio ativo da vida. Posicionando-se cardiocentrista,
considerava o coração a sede da alma, do intelecto e das emoções.
Estudioso
da biologia, Aristóteles, segundo Zingano (2014), advogava a ideia de todos os
seres que crescem, se alimentam e se reproduzem são possuidores da alma,
incluindo nessa condição tanto o homem como os animais e vegetais. Nesse caso,
o homem possuía uma alma com racionalidade e com a função pensante,
diferenciando a razão da sensação e da percepção. Assim, ele entendia que a
alma era mortal e pertencia ao corpo humano.
Vê-se,
portanto que Aristóteles é o autor do primeiro tratado acerca do tema
psicológico e é considerado o pai da anatomia comparada, tendo sido o primeiro
taxonomista e embriologista. . No seu tratado Da Alma, Aristóteles
distinguiu as diferentes faculdades desta alma: a faculdade vegetativa, a
sensitiva e a intelectual, defendendo que os vegetais teriam apenas a alma
vegetativa, princípio elementar da vida que envolvia as funções biológicas como
nutrição, crescimento e geração. Os animais irracionais possuíam a capacidade
do movimento e dotados de alma sensitiva, responsável pelo movimento do corpo e
pelas sensações. A respeito dessa obra, Bock (1991, 31) assinala que “Esse
filósofo chegou a estudar as diferenças entre a razão, a percepção e as
sensações. Esse estudo está sistematizado no Da alma que pode ser considerado o
primeiro tratado em Psicologia”.
Concernente
à alma sensitiva, assinala Myers (2006) que ele expôs cada um dos cinco
sentidos o que diferenciava o ser humano dos demais animais por ser dotado da
faculdade intelectual, ou seja, a capacidade e o desejo de conhecer. Com isso,
ele caracterizou o intelecto como a faculdade de pensar e que o objeto
alcançado pelos sentidos, seria reconhecido pela inteligência, significando que
o ser humano possuía todas as faculdades da alma que residiam no coração, o
qual possui papel importante por se encontrar centralmente posicionado no
corpo, sendo responsável pela produção de calor corporal, além de ser a fonte
do sangue e a origem dos vasos sanguíneos. Assim, tanto o cérebro como o
coração formariam uma unidade a qual permitiria o funcionamento normal do
corpo. Foi ele, ainda, quem fez considerações anatômicas da região cerebral,
observando as meninges, o cerebelo, o encéfalo, entre outras.
Segundo
Machado (2014), foi Aristóteles que
argumentou que é a razão que controla os atos humanos e nela há o raciocínio a
partir dos dados dos sentidos.
Uma das suas contribuições para a ciência
psicológica, conforme Myers (2006), é o ato de recordar por meio de uma
rede de associações existentes entre as experiências armazenadas pelo ser
humano.
Em
suma, tanto Platão quanto Aristóteles, ambos se dedicaram à especulação sobre o
homem e sua interioridade.
Há
que se observar que, segundo Machado (2014), com o neoplatonismo finda, mesmo
oficialmente, o pensamento grego – mais ou menos no tempo da queda do império romano
após doze séculos de vida – mandando Justiniano, imperador do Oriente, fechar a
escola neoplatonica de Atenas (529 D.C.). Entretanto, os valores eternos de
verdade, descobertos por esta tradição filosófica, que é a maior da humanidade,
não podiam perecer: serão eles conservados e valorizados no pensamento cristão,
bem como os grandes valores práticos, jurídicos, descobertos pela civilização
romana.
A FILOSOFIA HELENISTICA - O período helenístico ou greco-romano, segundo Chauí (2002), compreende
o final do séc. III A.C, até o séc. VI d. C., quando alcança Roma e o
pensamento dos primeiros padres da Igreja, se ocupando a filosofia com as
questões da ética do conhecimento humano e das relações entre o homem e a
natureza, bem como de ambos com Deus.
A
sistematização ocorrida com a escola sofista, segundo Padovani e Castagnola (1978),
proporcionou o nascimento de escolas socráticas menores, iniciadas pelas
escolas cínicas e cirenaicas que foram precursoras do estoicismo e do epicurismo,
possibilitando o surgimento da Academia e do Liceu, bem como da Gnosiologia, a
Cosmologia, a Teologia, a Moral, a Política e a Metafísica geral. Assim,
conforme registrado por Toynbee (1975) e Joyay e Ribbeck (1980), o período
helenístico tem inicio por volta de 322 A.C com a conquista da Grécia pelos
macedônios. A filosofia desse período é conduzida pelos discípulos de Platão e
Aristóteles. Surgem então diversas escolas, como a estoicista, a epicurista, a
pirronista, entre outras.
O
estoicismo, segundo Padovani e Castagnola
(1978), fundado por Zenão de Citium (334-262 A.C.), dividiu a filosofia em
lógica, física e ética, dando primazia à ética e unindo a vida à filosofia. Foi
exatamente Zenão que deu destaque à apatia no sentido aristotélico, ao considerar
sua significação como a permissão da liberdade com ausência de paixão, mesmo
que quem tenha esses sentimentos seja um escravo, uma vez que para essa escola
a felicidade só é alcançada por meio de uma alma disposta a ter indiferença
emocional com os eventos que possam ocorrer na vida. Inclusive, merece registro
que a definição estoica para a apatia é seguida até a atualidade.
A doutrina do epicurismo foi
criada pelo filósofo grego Epicuro (341-270 a.
C.), embasada no conceito atômico de Demócrito, defendendo que o conhecimento
ocorre por meio das sensações, de modo que as informações sensoriais são
apreendidas pela memória. Essa doutrina, segundo Padovani
e Castagnola (1978), foi fundada com base num materialismo teórico e num
ateísmo prático. Pelas observações efetuadas por
Mueller (1968) e Brugger (1987), foi Epicuro quem tratou mais densamente acerca
da imaginação ao designar como função filosófica o ensino da interpretação
correta do domínio dos impulsos físicos, pleiteando a prática da concentração
via imaginação visando o prolongamento da vida. Para esse pensador, a
imaginação é a força que leva à superação dos sofrimentos e tristezas,
incluindo-se a cura das enfermidades humanas.
A escola
cética, segundo Gomes (2014b), impunha a
dúvida radical sobre o conhecimento verdadeiro. Dessa doutrina surgiu o
ceticismo metodológico reconhecido como procedimento necessário para
legitimação do conhecimento, e o ceticismo universal voltado para a
relatividade do conhecimento sensorial, as contradições do conhecimento a falta
de critério suficiente de verdade. Essa doutrina foi desenvolvida por Sexto, o
Empírico.
Padovani
e Castagnola (1978) ainda acrescentam a escola eclética que se apresentou como
um sistema afim ao cetisicmo, apresentando-se como síntese prática dos
elementos estoicos, acadêmicos e peripatéticos.
Outras
escolas, segundo Mueller (1968) aconteceram sem maiores destaques como o, a escola cínica fundada por
Antístenes e a escola cirenaica ou hedonista Aristipo, entre outras.
Nesse
período, conforme Cotrim (2006, p. 107) surgem pensadores como Sêneca, Cícero,
Plotino e Plutarco que, “[...] dedicaram-se muito mais à tarefa de assimilar e
desenvolver as contribuições culturais herdadas principalmente da Grécia
clássica do que criar novos caminhos para a filosofia”. Entre esses, segundo
Melo e Silva (2014), o filosofo e tragediógrafo Lucius Annaeus Sêneca (4 A.C. –
65 D.C) que desenvolveu a filosofia estoica em Roma, tendo como ponto
culminante a sua obra As troianas com cenas da angústia humana e da crueldade,
encenando as vivências e situações humanas.
Marco Túlio
Cícero (106-43 a. C.) foi influenciado pelas ideias platônicas e estoicas, que
segundo Gomes (2014b), passava pelo
reconhecimento do conjunto de doenças da alma (animi medicina) correspondentes à
deficiência mental, a insanidade e a demência que deveriam ser curadas pela
alma, considerando que a razão e a vontade são poderes inerentes à alma.
Plotino
(204-270 D.C.) recebeu influências platônicas e aristotélicas, tornando-se o
último filósofo de relevo da antiguidade, intermediando o pensamento cristão e
grego ao defender que o ser humano pertence ao mundo dos sentidos e da
inteligência, fazendo distinção entre o que é sensorial e a impressão. É
considerado por Padovani e Castagnola (1978) como
neoplatonista, corrente inaugurada em Alexandria do Egito por Amônio Saca, mas
tida como fundada por Plotino.
Merece
registro o fato de que na escola da Alexandria Ptolomaica que existiu entre o
séc. III A.C., até o séc. VII D.C., vários estudos foram desenvolvidos sobre
estruturas anatômicas do corpo humano, nervos cranianos, ventrículos cerebrais
e o sistema vascular, realizadas por Herófilo sob a influência de Hipócrates. O
seu sucessor, Erasístrato fundou a fisiologia e diferenciou os nervos sensitivos
e motores. Depois deles, surgiu Cláudio Galeno no sec. II A.C., tornando-se o
pai da medicina, com estudos nessa área, além da fisiologia e da anatomia,
reorganizando o conhecimento médico acerca das funções mentais e do cérebro. .
Observa
Bock (1991, p. 52) que “[...] falar de psicologia nesse período é relacioná-la
ao conhecimento religioso, já que, ao lado do poder econômico e político, a
Igreja Católica também monopolizava o saber e, consequentemente, o estudo do
psiquismo”.
Por todo
exposto, é de fundamental necessidade explicitar o entendimento de Castro e Landeira-Fernandez (2011, p. 8) acerca de que o
pensamento da antiguidade contribuiu sobremaneira com o desenvolvimento da
Psicologia, ao consideraram que:
As propostas feitas por esses pensadores a respeito de
questões centrais - relacionadas com a fonte do pensamento humano, o mecanismo
da atividade cognitiva e a natureza das emoções, percepção e movimento
voluntário - ainda nos fascinam e contribuem pela originalidade e pela riqueza
de suas implicações, marcando de maneira fundamental o pensamento científico e
filosófico da Idade Moderna.
Tal
condução leva ao entendimento desenvolvido pelos autores de que a contribuição
dos filósofos e médicos gregos da antiguidade possibilitaram as especulações
que alicerçaram os conceitos da neurociência moderna. Além disso, destaca Chauí
(2002, p. 22) que a contribuição da filosofia grega antiga também se
notabilizou porque “A ideia de que nosso pensamento também opera obedecendo a
leis, regras e normas universais e necessárias, segundo as quais podemos
distinguir o verdadeiro do falso. Em outras palavras, a ideia de que nosso
pensamento é lógica ou segue lógicas de funcionamento”. Também Myers (2006) assinala de
grande importância à contribuição para a psicologia do pensamento
pré-científico da Grécia antiga, que conseguiu oferecer muitas percepções
duradouras sobre a natureza humana.
CONSIDERAÇÕES FINAIS - Com a realização do estudo ora realizado, tomou-se
conhecimento de que foi na Grécia antiga que se deram os primeiros passos
acerca da psicologia, notadamente quando o ser humano passou a observar e
compreender a si próprio e ao mundo.
Na
verdade o termo psicologia só viria aparecer mesmo apenas no final do século
XVI, mais exatamente em 1590, oriunda dos estudos filosóficos realizados desde
a Grécia antiga até então. Tal fato dá-se em virtude do surgimento da Ciência
por meio do filósofo inglês Francis Bacon, sendo, assim, denominada por Rudolph
Goclenius, com o significado de tratado ou ciência da alma.
Contudo,
o presente trabalho compreendeu o período do século 700 A.C., até às vésperas
da era cristã na dominação romana. Em vista disso, faz-se necessário considerar
que o nascimento da Psicologia surge desde a Grécia antiga, quando os filósofos
pré-socráticos começaram as investigações filosóficas que possibilitaram a
eclosão de diversos ramos científicos.
Nesse
período foi possível identificar o papel da filosofia da Grécia antiga como o
nascedouro para questionamentos a respeito das mais diversas atividades humanas
e, especificamente, mentais, elaborando especulações sobre o funcionamento e
desenvolvimento de estruturas corporais, bem com a relação do corpo com a mente
ou a alma, a divisão da alma de Platão apontando para as emoções, desejos, intelecto,
entre outras áreas; na medicina de Alcmeón e Hipócrates, nas investigações
pré-socráticas sobre a mente e o corpo; no pensamento aristotélico que embasou
o desenvolvimento da ciência psicológica; na investigação neuroanatômico de
Herófilo e Erasístrato, na localização do centro das atividades e funções
mentais notadamente pelo desenvolvimento das teorias cardiocentristas e
cefalocentrista, a relação entre o coração e o cérebro com a alma ou mente,
enfim, dos conjuntos de pensamentos que contribuíram para a neurociência e, por
consequência, para a psicologia.
Há
que se levar em consideração, por conclusão, que tais fatos proporcionaram a
ocorrência da consolidação e autonomia da Psicologia no final do séc. XIX, por
meio dos trabalhos psicofísicos de Weber, do fisiologista e psicólogo alemão
Gustav Fechener, até dar-se a sua fundação por meio da criação do primeiro
laboratório por Wilhelm Wundt, em 1879, em Leipzig, Alemanha, quando passou a
ter a significação do estudo do organismo humano e animal, além de se voltar
para os fenômenos psicológicos em sua completa variedade e complexidade, bem
como da finalidade de ser capaz de efetuar as predições mais adequadas acerca
desses fenômenos.
Por
fim, reconhece-se que foram esses filósofos
da antiguidade que se debruçaram sobre questões psicológicas como a memória, a
aprendizagem, a percepção, a motivação, os sonhos e principalmente o
comportamento anormal, tentando explicá-las para fazer a base do conhecimento
da área na atualidade.
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Acesso em 07 fev 2014.
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Trabalho apresentado por Luiz Alberto Machado e Luis Gustavo Barbosa Tenório
para a disciplina Bases Filosóficas e Epistemológicas da Psicologia, do Centro
Universitário Cesmac, ministrada pelo Prof. Álvaro Queiroz.
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