sexta-feira, 21 de março de 2014

AS PRESCRIÇÕES JURÍDICAS DE NORBERTO BOBBIO




TEORIA DA NORMA JURÍDICA – O obra Teoria da norma jurídica, de Norberto Bobbio, trata de temas como o direito como regra de conduta, justiça, eficácia e validade, as proposições prescritivas, as prescrições e o direito e a classificação da norma jurídica.
Ao efetuar uma leitura do capítulo V da obra Teoria da Norma Jurídica, do eminente filósofo, escritor e senador vitalício italiano, recentemente falecido, Norberto Bobbio, abordando o tema As prescrições jurídicas, onde trata acerca da busca de um critério dentre vários critérios abordados, a resposta à violação, as sanções morais, sociais e jurídicas, a adesão espontânea, as normas sem sanção, a ordenação sem sanção e, por fim, as normas em cadeia e o processo ao infinito.
Introdutoriamente, convém observar que Norberto Bobbio, considerado um dos filósofos mais importantes do século 20, um dos mestres da liberdade e a consciência democrática italiana, era o líder dos Democratas da Esquerda, maior partido de oposição italiano e sucessor do partido Comunista da Itália.
O filósofo foi nomeado senador vitalício em 1984, pelo então presidente Sandro Pertini (1978-85). Há cerca de uma década, foi considerada a possibilidade de ser candidato à presidência italiana, um cargo de pouco poder político, mas grande autoridade moral. Nascido na cidade industrial de Turim em 18 de outubro de 1909, Bobbio formou-se em Filosofia e Direito nos anos 30. Em 1935, foi brevemente preso por sua oposição ao regime fascista. Durante a Segunda Guerra Mundial (1939-45), Bobbio atuou no movimento de resistência antifascista e integrou o "Partido de Ação", grupo de radicais de esquerda que mais tarde ajudaram a moldar a política pós-guerra. Doutor em Filosofia, Bobbio era professor benemérito da Universidade de Turim, onde deu aulas de Filosofia do Direito, Ciências Políticas e Filosofia da Política durante várias décadas. Em 1975, o inteletcual italiano iniciou em seu país um debate sobre socialismo, democracia, marxismo e comunismo, que influenciou as novas gerações de toda Europa. Bobbio escreveu para vários jornais e revistas, incluindo o "Corriere della Sera", principal diário do país. E, ao longo de sua carreira, Bobbio escreveu centenas de livros, ensaios e artigos. Um de seus livros mais importantes é "Politica e Cultura" (1955). Bobbio recebeu o título doutor honoris causa diversas vezes, na Itália e em outros países. Dele, quase todas as obras foram traduzidas no Brasil. A abrangência é vasta: da filosofia do direito à ética, da filosofia política à história das ideia, sem esquecer os grandes debates contemporâneos, invariavelmente analisados com lucidez, elegância e coerência filosófica. Mas é de sua vida como professor que o filósofo teve a sua principal atividade, e foi nesse período que aprofundou seus estudos sobre o jurista Hans Kelsen (inspirador de sua concepção da democracia como sistema de regras que permitem a convivência livre e pacífica) e sobre o filósofo Thomas Hobbes (ideia hobbesianas como o individualismo, o contratualismo e a ideia de paz através da constituição de um poder comum contribuíram - como ele próprio reconhece - para a formação de seu pensamento político). Identificando-se com os estudos sobre o direito, Bobbio observou ao longo dos anos uma atitude emblemática do positivismo ideológico apontada nos juristas da Escola da Exegese, que não se limitavam a constatar que, na sua sociedade, naquele momento histórico, o direito apresentava-se somente através da lei, mas valoravam positivamente este fato. Assim, na imagem de Bobbio, seriam não apenas intérpretes, mas também admiradores do Código de Napoleão. Neste sentido, ao observar o positivismo como ideologia, Bobbio observa que o jusnaturalismo e o positivismo extremista (isto é, o positivismo ético) identificam ambas as noções de validade e de justiça da lei, mas, enquanto o primeiro deduz a validade de uma lei da sua justiça, o segundo deduz a justiça de uma lei de sua validade. Esta versão faz jus às acusações de ter preparado terreno para o totalitarismo nazi-fascista na primeira metade do século passado na Europa, permitindo que tenha ocorrido uma reductio ad Hitlerum do positivismo jurídico.
Por outro lado, a versão moderada não poderia receber o mesmo tratamento da outra modalidade. Bobbio aponta o valor instrumental do direito sustentado por esta versão de que o direito tem um valor enquanto tal, independente do seu conteúdo, mas não porque (como sustenta a versão extremista) seja sempre por si mesmo justo (ou com certeza o supremo valor ético) pelo simples fato de ser válido, mas porque é o meio necessário para realizar um certo valor, o da ordem (e a lei é a forma mais perfeita de direito, a que melhor realiza a ordem).Para o positivismo ético, o direito, portanto, tem sempre um valor mas, enquanto para sua versão extremista trata-se de um valor final, para a moderada trata-se de um valor instrumental. Desta forma, o positivismo jurídico, enquanto teoria, baseia-se em seis concepções fundamentais, conforme menciona Bobbio: teoria coativa do direito; teoria legislativa do direito; teoria imperativa do direito; teoria da coerência do ordenamento jurídico; teoria da completitude do ordenamento jurídico; e teoria de interpretação lógica ou mecanicista do direito. Assim, explica que um ordenamento jurídico não é necessariamente coerente, porque podem coexistir no mesmo ordenamento duas normas incompatíveis e serem ambas válidas; que um ordenamento jurídico não é necessariamente completo, porque a completitude deriva do princípio da reserva legal, segundo o qual tudo que não é proibido é permitido. Tal princípio, excetuando-se o campo do direito penal, não rege a maior parte dos casos; e a interpretação do direito feita pelo juiz não se resume num procedimento puramente lógico.
A partir disso Bobbio explica que, no direito, poderiam ser diferenciados dois momentos: o ativo ou criativo e o teórico ou cognoscitivo. O primeiro manifestando-se de forma mais típica na legislação, o segundo na ciência jurídica ou na jurisprudência, sendo esta definida como a atividade cognoscitiva do direito visando a sua aplicação. A natureza cognitiva da jurisprudência reporta-se a uma atividade declarativa ou reprodutiva de um direito preexistente, pura contemplação de um objeto já dado. Assim, os autores da Escola da Exegese sustentavam que os juízes não eram nada mais que a “boca da lei”. Deste modo, a tradição do positivismo jurídico concebia a atividade da jurisprudência como sendo voltada não para produzir, mas para reproduzir o direito, explicitando por meios lógico-racionais o conteúdo das normas jurídicas já dadas. Assim, seria tarefa do aplicador do direito não a sua criação, mas a sua interpretação.
No final dos anos 60, Noberto Bobbio, ao abrir um debate sobre o presente e o futuro dos direitos do homem, dividia sua história em três fases. Na primeira, inaugurada pelo jusnaturalismo moderno, os direitos humanos formulados pelos filósofos eram universais em seu conteúdo, porquanto baseados numa natureza humana ideal, mas limitados em relação à sua eficácia. Esta universalidade abstrata foi superada quando as Revoluções Americana e Francesa permitiram a passagem da teoria à prática ao declararem os direitos naturais como fundamentos da nova ordem, dotando-os de uma particularidade concreta em que os direitos do homem foram positivados como direitos dos cidadãos de um determinado Estado. Por fim, com a Declaração de 1948 teve início o período da universalidade concreta no qual a afirmação dos direitos é, ao mesmo tempo, universal e positiva, abrangendo todos os seres humanos e buscando sua efetividade até mesmo contra os Estados que os violam. Assim, como reconhece o próprio Bobbio, estamos apenas no início do processo de realização da universalidade concreta daqueles direitos. Entre os obstáculos que a ela se opõem encontra-se o subdesenvolvimento que atinge a maioria das nações do globo, nas quais os direitos humanos permanecem em grande parte uma aspiração. Dentre eles, são os direiltos sociais e econômicos, que também chama de direitos coletivos, que mais carecem de efetiva proteção. Constituindo um conjunto de prestações que devem contar com a ação do Estado para seu gozo, tais direitos defrontam-se com o desaparelhamento dos poderes públicos para cumprirem com este papel, tanto pelas insuficiências de sua organização intitucional quanto pela ausência e má destinação de recursos. Daí, vê-se que a completude do ordenamento jurídico, provinda dos primórdios do Estado de Direito, especialmente da Escola da Exegese, significa que o Direito positivado abarca toda a fenomenologia que, direta ou indiretamente interessando ao homem, requer tutela estatal. Noutras palavras, o Direito, entendido como o corpo de normas jurídicas vigentes, regula ou dispõe de mecanismos que venham a regular quaisquer situações fáticas de interesse do homem. Assim, o Direito, na acepção citada, é pleno, não apresentando, portanto, lacunas ou vazios, que deixariam aquelas situações sem amparo - o Direito resolve tudo, desde que seja relevante, pois apenas os fatos de relevância exigem proteção estatal por esse meio.
A teoria da norma geral exclusiva afirma a completude do ordenamento jurídico a partir do entendimento de que as ações humanas não regulamentadas são implicitamente admitidas e aceitas por esse ordenamento. Observa-se que não se confundem a falta de regulamentação aqui exposta e a ausência de expressa disposição legal. Nessa última hipótese, a ratio legis do sistema jurídico, notadamente no que pertine aos princípios gerais do direito, estará regendo todos os casos não dispostos na literalidade da lei, desde que com estes guarde o imprescindível nexo causal. O mesmo não corre nas situações em relação às quais o Direito mostra-se alheio, e é neste sentido que se fala, para os fins de análise, em não regulamentação. Dito de outra forma, a norma geral exclusiva implica em que todas as ações não proibidas são permitidas pelo ordenamento, o que redunda em liberdade, compreendida como a faculdade natural de fazer aquilo que apraz a cada um, salvo o que seja impedido pela força ou pelo Direito, até mesmo em razão da impossibilidade de o Direito positivo abarcar, seja de forma explícita, seja de forma implícita, todas e quaisquer nuances da vida em sociedade. As normas existentes, denominadas particulares e inclusivas, trazem em seu bojo as normas gerais exclusivas, que lhes são correspondentes. Assim, defende Bobbio que toda a atividade humana é regulada por normas jurídicas, porque aquela que não cai sob as normas particulares cai sob as gerais exclusivas. E, assim, é contestada essa teoria com a observação de que existem nos ordenamentos jurídicos as normas ditas gerais inclusivas, as quais regulam os casos não-compreendidos na norma particular, mas semelhantes a eles, de maneira idêntica, , diferentemente das normas gerais exclusivas, que os regulariam de maneira oposta à utilizada pelas normas particulares. Vê-se que a semelhança dos casos deve ser detectada através do processo interpretativo. Bobbio observa então os vários tipos de lacunas, que inicialmente, distinguem-se lacunas próprias e impróprias. Lacunas próprias confundem-se com lacunas reais. São as existentes no sistema jurídico tal qual este se apresenta, desde que nele estejam presentes tanto as normas gerais exclusivas quanto as normas gerais inclusivas. São sanadas a partir da interpretação das leis positivadas. Aqui cabe falar-se em (in)completude do ordenamento jurídico: "A lacuna em sentido próprio existe quando se presume que o intérprete [...] decidiu com uma dada norma do sistema e essa norma não existe ou, para ser mais exato, o sistema não oferece a devida solução" (Bobbio, 1999:145). Lacunas impróprias são as que se fazem presentes quando o ordenamento jurídico contém apenas as normas gerais exclusivas, além das normas particulares, exigindo uma solução por intermédio de normas a serem criadas pelo legislador. Assemelham-se às lacunas ideológicas. Também pode ser feita a diferenciação entre lacunas subjetivas e lacunas objetivas. Subjetivas são as lacunas que têm como causa existencial a pessoa do legislador, que ora deixa de criar a norma voluntariamente, ora involuntariamente não regulamenta um fato ou ato jurídicos. Por sua vez, objetivas são as lacunas cuja fonte de existência não é imputada ao legislador, mas a fatores outros que fazem surgir necessidades inéditas nas relações sociais, necessidades que passam a reclamar ao Direito a regulamentação condizente à harmonia dos homens que na sociedade interagem. Ainda procede-se à distinção entre lacunas præter legem e intra legem. As lacunas præter legem existem quando as regras jurídicas não abarcam em seu campo de incidência os fatos sociais semelhantes aos regulamentados, exigindo-se, para a integração do ordenamento jurídico, a criação de normas que os regulamentem. As lacunas intra legem, por outro lado, ocorrem quando as normas positivadas apresentam tal grau de generalidade que vazios aparecem no ordenamento, a reclamar solução por parte do intérprete. Neste sentido pode-se observar os aspectos da heterointegração e auto-integração são duas formas de tornar completo o ordenamento jurídico, consistindo a primeira na utilização de ordenamentos alienígenas e/ou de fontes diversas da lei positivada, ao passo que a segunda não recorre a ordenamentos estrangeiros e minimiza ao máximo o uso de fontes que não sejam a lei.
No que se refere à heterointegração, constata-se o seguinte: lançando-se mão de ordenamentos outros que não o pátrio, esses podem ser os vigentes na atualidade, os que vigeram ou o Direito natural imaginado como um sistema jurídico perfeito (Bobbio, 1999:147); quanto ao recurso a outras fontes de Direito que não sejam as leis, têm-se: o costume, cuja utilização pode ser ampla ou restrita, quando, respectivamente, a lei lhe dá grande margem de atuação enquanto nascedouro do Direito ou limita essa mesma atuação; as sentenças judiciais, configurando o Direito judiciário (Bobbio, 1999:149), bem como a opinião abalizada dos juristas, que é o Direito científico. A propósito, os costumes integram o direito internacional público, notadamente as normas internacionais fundamentais. Assim, é preciso ascender dos dois casos a uma qualidade comum a ambos, que seja ao mesmo tempo a razão suficiente pela qual ao caso regulamentado foram atribuídas aquelas e não outras consequências (Bobbio, 1999:153). É essa analogia que se encontra na norma geral inclusiva. Cabe assim o esclarecimento acerca da interpretação extensiva, diferenciando-a da analogia. Interpretação extensiva é o mecanismo que consiste na extensão de uma norma jurídica aos casos que esta não prevê, significando que tais casos não são previstos expressamente pela norma, todavia o são de forma tácita, uma vez que o legislador apenas não os alinhou com os consignados na literalidade legal. O alcance da norma, enfim, é alargado para englobar as espécies não registradas pela letra da lei. Na interpretação extensiva, "nos limitamos à redefinição de um termo, mas a norma aplicada é sempre a mesma" (Bobbio, 1999:156). Os princípios não-expressos são aqueles que se podem tirar por abstração de normas específicas ou pelo menos não muito gerais: são princípios, ou normas generalíssimas, formuladas pelo intérprete, que busca colher, comparando normas aparentemente diversas entre si, aquilo a que comumente se chama o espírito do sistema (Bobbio, 1999:159). Ao encerrar o estudo da completude do ordenamento jurídico, Bobbio alinha (1999:160):
A primeira condição para que se possa falar de lacuna é a de que o caso não esteja regulado: o caso não está regulado quando não existe nenhuma norma expressa, nem específica, nem geral, nem generalíssima, que diga respeito a ele, quer dizer, quando, além da falta de uma norma específica que lhe diga respeito, também o princípio geral, dentro do qual poderia entrar, não é expresso.
Assim sendo, a completude do ordenamento jurídico, defendida pelos positivistas, no propósito de ter respostas para todas as problemáticas humanas num único ordenamento, que necessariamente tem vigência espacial e temporal limitada, é um ideal que não pode ser alcançado. A estupenda e maravilhosa dinâmica da convivência humana, ao criar realidades a cada momento e ao apresentar nuances sempre novas em velhos fenômenos que se encontram sob cobertura do Direito, impede o alcance daquele ideal. Com isso, o capítulo V da obra Teoria da Norma Jurídica, versando sobre as prescrições jurídicas, parte da tese de que o problema da “distinção entre normas jurídicas e outros tipos de normas chamado de características diferenciais da norma jurídica – com freqüência desprezado e repelido, mas continuamente emergente – não se resolve permanecendo-se nos limites de um estudo puramente formal das proposições normativas” (Bobbio, 1999:145/146). Ele defende que as proposições normativas pertencentes ao direito fossem diferentes de outras proposições normativas devido a uma característica inerente à sua natureza de prescrições (Bobbio, 1999:146).
Ao abordar os critérios, Boobio abandona o critério puramente formal, drigindo-se à solução que julga mais satisfatória, reagrupando em torno de alguns critérios fundamentais, afora os formais, um certo número de teorias típicas, observando, então, que o critério mais seguido sempre foi o de procurar individualizar o caráter da norma jurídica através do seu conteúdo. Pertencem a esta categoria as teorias que afirmam como característica da norma jurídica regular sempre uma relação intersubjetiva, quer dizer, uma relação não entre uma pessoa e uma coisa, nem entre uma pessoa e si mesma, mas entre uma pessoa e uma outra pessoa. Nisso ele aborda que esta teoria se exprime também atribuindo à norma jurídica o caráter da bilateralidade, diversamentemente da norma moral que seria unilateral. O caráter da bilateralidade consistiria no seguinte: a norma jurídica institui ao mesmo tempo um direito a um sujeito e um dever a um outro; e a relação intersubjetiva, ao constituir o conteúdo típico da norma jurídica, consistiria precisamente na relação de interdependência entre um direito e um dever. Detecta, portanto, uma insuficiência no critério do conteúdo, quando nasce a exigência de um novo critério, o do fim. E com base nesse novo critério, se responde que o direito regula sim, como as normas sociais, relações intersubjetivas, mas não relações intersubjetivas genéricas, vez que tais relações são reguladas pelo direito são específicas e a sua especificidade é dada pelo fim a que o ordenamento normativo jurídico se propõe no confronto com todos os outros ordenamentos normativos vigentes naquela determinada sociedade. Assevera Bobbio acerca da insuficiência do critério do fim, onde é impelido quase fatalmente, ao critério do sujeito que estabelece a norma. O critério do fim é insuficiente porque o juízo sobre para que serve o fim, ou seja, a conservação da sociedade varia de tempos em tempos, de lugar para lugar. E com isso conclui que a norma jurídica é aquela que, independentemente da forma que assuma, do conteúdo que possua, do fim a que se proponha, é estabelecida pelo poder soberano, ou seja, por aquele poder que em uma dada sociedade não é inferior a nenhum outro poder, mas que está em posição de dominar todos os outros. Observa que a crueza da teoria positivista do direito reenvia ao seu oposto, ou seja, à teoria jusnaturalista na acepção mais ampla do termo, isto é, a todas aquelas doutrinas que buscam a essência do direito nos valores em que o legislador se inspira. Concorda que o direito positivo seja aquele estabelecido e importo pelo soberano, mas será necessário distinguir as decisões segundo os ideiais em que se inspiram, e então serão jurídicas não todas as regras, mas somente as que se inspiram em determinados valores (Bobbio, 1999:150).
Um quinto grupo de teorias é o que se caracteriza pelo fato de procurar a natureza específica da norma jurídica no modo como é acolhida pelo destinatário, ou, em outros termos, na natureza da obrigação. Apresenta pois um novo critério: a resposta à violação, tratando do critério que se refere ao momento da resposta à violação que, portanto, acarreta a noção de sanção. À violação da-se o nome de ilícito. O ilícito consiste em uma ação quando a norma é um imperativo negativo e em uma omissão quando a norma é um imperativo positivo (Bobbio, 1999:152). Define a sanção como resposta à violação, quando todo sistema normativo conhece a possibilidade da violação e um conjunto de expedientes para fazer frente a esta eventualidade. Trata-se de ver se existem tipos diversos de resposta e se eles permitem uma classificação dos diversos ordenamentos normativos. Daí ele parte para entender que a sanção pressupõe a violação da norma e que há um modo de definir as normas morais que se refere precisamente à sanção. Afirmação que são morais aquelas normas cuja sanção é puramente interior. Por sanção, entende-se sempre uma conseqüência desagradável da violação, cujo fim é prevenir a violação ou, no caso em que a violação seja verificada, eliminar as consequências nocivas. O fim da sanção é a eficácia da norma, ou, em outras palavras, a sanção é um expediente para conseguir que as normas sejam menos violadas ou que as consequências da violação sejam menos graves. O defeito da sanção interior é o de ser escassamente eficaz e é certamente um meio inadequado.
Por outro lado, Bobbio observa que a sanção externa é característica das normas sociais, isto é, de todas as normas do costume, da educação, da vida em sociedade em geral, que são voltadas ao fim de tornar mais fácil ou menos difícil a convivências. Estas normas nascem, geralmente, de um grupo social em forma de costumes, o mesmo grupo social que responde à sua violação com diversos comportamentos que constituem as suas sanções. E ressalta: o defeito das sanções sociais não é, todavia, a falta de eficácia, mas a falta de proporção entre violação e resposta (Bobbio, 1999:158) Com o objetivo de evitar os inconvenientes da sanção interna, isto é, sua escassa eficácia, e os da sanção externa não institucionalizada, sobretudo a falta entre violação e resposta, o grupo social institucionaliza a sanção, ou sejam, além de regular os comportamentos dos cidadãos, regula também a reação aos comportamentos contrários. Esta sanção se distingue da moral por ser externa, isto é, por ser uma resposta de grupo, e da social por ser institucionalizada, isto é, por ser regulada, em geral, com as mesmas formas e através das mesmas fontes de produção das regras primárias. Ela oferece um critério para distinguir as normas que habitualmente se denominam jurídicas das normas morais e das normas sociais. Trata-se das normas cuja violação tem por consequência uma resposta externa e institucionalizada. Defende então que o principal efeito da institucionalização da sanção é a maior eficácia das normas jurídicas: para toda violação de uma regra primária, é estabelecida a relativa sanção; é estabelecida, se bem que dentro de certos termos, a medida da sanção; e são estabelecidas pessoas encarregadas de efetuar a execução. Daí sustenta a tese de que é útil para delimitar o âmbito da noção de direito levar em conta o tipo de resposta que os diversos ordenamentos dão à violação das regras de conduta. E argumenta: o primeiro argumento é a adesão espontânea. A sanção, afirma-se não é elemento constitutivo do direito porque um ordenamento jurídico conta, antes de tudo, com a adesão espontânea às suas regras, isto é, com a obediência não por temor das consequências desagradáveis de uma eventual violação, mas por consenso, ou convenção, ou mero hábito, de qualquer forma, por motivos de que não pressupõem a possível movimentação do mecanismo da sanção. Não se sustenta porque os defensores da adesão espontânea replicam com o argumento filosófico, segundo o qual, o homem, sendo livre por sua natureza, não ser constrangido, e portanto também a obediência obtida através da sanção é sempre uma obediência livre, fundada no consenso, e como tal, indistinguível daquela denominada espontânea.  
Com relação às normas sem sanção, Bobbio coloca que o argumento mais comum e também mais fácil contra a teoria que vê na sanção um dos elementos constitutivos de um ordenamento jurídico é p que se funda na presença, em todo ordenamento jurídico, de normas não garantidas por sanção. A presença de normas não sancionadas em um ordenamento jurídico é um fato incontestável.  Defende então frente à objeção fundada na constatação de normas sem sanção em um ordenamento jurídico. É tese aceita por alguns internacionalistas que o direito internacional tenha também as suas sanções e preveja o modo e a medida do seu exercício. A violação de uma norma internacional por parte do estado constitui um ilícito.
Conclui, assim, que todo ordenamento interncional, em geral, diversamente do estatal, é fundado sobre o princípio da autotutela e que, portanto, o que diferencia o ordenamento internacional do estatal não é a ausência ou a presença de sanções organizadas, mas a organização da sanção através da autotutela ou da heterotutela. Que o instituto da autotutela seja manifestação de uma sociedade menos organizada do que aquela em que vige o princípio da heterotutela, importa em uma diferença não de substância, mas de grau, entre o ordenamento internacional e o estatal, diferença, aliás, que ninguém jamais negou. Enfim, arremata: as normas não sancionadas representam aquele mínimo de consenso sem o qual nenhum Estado poderia sobreviver.

REFERÊNCIA
BOBBIO, Norberto. Teoria da Norma Jurídica. Brasília: UnB, 1999.

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