segunda-feira, 13 de abril de 2015

PSICOPATOLOGIA – A CONSCIÊNCIA E SUAS ALTERAÇÕES


CONSCIÊNCIA - Para Paim (1993), a consciência é um complexo de fenômenos psíquicos elementares ou complicados, afetivos e intelectivos, que se apresentam na unidade de tempo e que permitem conhecimento do próprio eu e do mundo exterior.
O termo consciência, para Dalgalarrondo (2008), origina-se da junção de dois vocábulos latinos: cum (com) e scio (conhecer), indicando o conhecimento compartilhado com outro e, por extensão, o conhecimento “compartilhado consigo mesmo”, apropriado pelo indivíduo.
As definições de consciência, segundo Dalgalarrondo (2008), são consideradas sobre três aspectos: 1 - A definição neuropsicológica emprega o termo consciência no sentido de estado vígil (vigilância), o que, de certa forma, iguala a consciência ao grau de clareza do sensório. Consciência aqui é fundamentalmente o estado de estar desperto, acordado, vígil, lúcido. Trata-se especificamente do nível de consciência. 2. A definição psicológica a conceitua como a soma total das experiências conscientes de um indivíduo em determinado momento. Nesse sentido, consciência é o que se designa campo da consciência. É a dimensão subjetiva da atividade psíquica do sujeito que se volta para a realidade. 3. A definição ético-filosófica é utilizada mais frequentemente no campo da ética, da filosofia, do direito ou da teologia. O termo consciência refere-se à capacidade de tomar ciência dos deveres éticos e assumir as responsabilidades, os direitos e os deveres concernentes a essa ética. Assim, a consciência ético-filosófica é atributo do homem desenvolvido e responsável, engajado na dinâmica social de determinada cultura. Trata-se da consciência moral ou ética.
Do ponto de vista da psicologia, segundo Paim (1993) é um processo de coordenação e de síntese da atividade psíquica. Nesse processo se encontra a consciência do eu, como conhecimento que se tem da existência como individualidade distinta das demais coisas do mundo, e da consciência dos objetos, significado tudo que é apreendido ou que se encontra, em dado mento, no campo da consciência, seja uma percepção, uma representação ou um conceito.
A consciência subjetiva é a propriedade de serem os fenômenos conscientes conhecidos pelo individuo. A consciência objetiva por seu conteúdo, que se reflete no plano subjetivo sob a forma de percepções, representações e conceitos.
Ao campo da consciência chega também uma série de sensações cinestésicas que orientam o individuo sobre a própria personalidade.
A consciência é um todo único e indivisível.

O INCONSCIENTE - O inconsciente, para Paim (1993) designa os processos nervosos que escapam inteiramente ao conhecimento pessoal, como a maior das regulações orgânicas; em sentido amplo, é tudo quanto num determinado momento escapa à consciência, sem diferenciar entre o subconsciente e o inconsciente essencial; e no sentido de Freud, qualifica os processos dinâmicos que atuam eficazmente sobre a conduta sem que atinjam a consciência. Em psicologia, o inconsciente é empregado como adjetivo para qualificar determinado fato psicológico que escapa ao conhecimento do individuo, sendo, pois, o conjunto de processos psicológicos que estão fora da consciência. A maior parte da vida anímica se desenvolve no inconsciente.
O inconsciente, segundo Dalgalarrondo (2008), funciona regido pelo princípio do prazer por meio do processo primário em forma de condensação e  deslocamento. É isento de contradições mútuas e não possui referência ao tempo: 1. Atemporalidade = No inconsciente, não existe tempo; ele é atemporal. Os processos inconscientes não são ordenados temporalmente, não se alteram com a passagem do tempo, não têm qualquer referência ao tempo.  2. Isenção de contradição = no sistema inconsciente, não há lugar para negação ou dúvida, nem graus diversos de certeza ou incerteza. Tudo é absolutamente certo, afirmativo. 3. Princípio do prazer = o funcionamento do inconsciente não segue as ordens da realidade, submete- se apenas ao princípio do prazer. Toda a atividade inconsciente visa evitar o desprazer e proporcionar o prazer, independentemente de exigências éticas ou realistas. A busca do prazer se dá por meio da descarga das excitações, diminuindo-se ao máximo a carga de excitações no aparelho psíquico. 4. Processo primário = as cargas energéticas (catexias) acopladas às representações psíquicas, às ideias, são totalmente móveis.
A repressão, para Paim (1993), é um processo que se inicia na primeira infância, sob a influencia dos princípios éticos dominantes no ambiente, perdurante durante toda a vida do individuo. O inconsciente contém apenas as partes da personalidade que poderiam ser conscientes se o processo da cultura não as tivesse reprimido.
Para Paim (1993), existem dois tipos de inconsciente: um latente, capaz de tornar-se consciente; e outro reprimido, que não é, em si próprio e sem mais trabalho, capaz de tornar-se consciente.

ALTERAÇÕES DA CONSCIÊNCIA - As alterações da consciência – patologia – são devidas a perturbações da atividade fisiológica dos hemisférios cerebrais.
Para Dalgalarrondo (2008), a obnubilação ou turvação da consciência é o rebaixamento da consciência em grau leve a moderado.
Para Paim (1993) os estados patológicos da consciência são obnubilação, coma, delírio oniróide, amência ou confusão mental, estados crepusculares e onirismo.

OBNUBILAÇÃO - A obnubilação da consciência é um desvio mórbido do curso normal dos processos psíquicos. Caracteriza-se, essencialmente, pela diminuição do grau de clareza do sensório, com lentidão da compreensão, dificuldade da percepção e da elaboração das impressões sensoriais. Os processos psíquicos são fragmentários e os sentimentos muito imprecisos, sem que possam conduzir à execução de qualquer ato volitivo.  A obnubilação da consciência representa um sintoma obrigatório na maior parte dos transtornos mentais sintomáticos. Nesses casos, a obnubilação tem valor de sintoma objetivo, visto que ela se reflete na expressão fisionômica da conduta do enfermo.

COMA - Para Dalgalarrondo (2008), o coma é o grau mais profundo de rebaixamento do nível de consciência. No estado de coma, não é possível qualquer atividade voluntária consciente. Além da ausência de qualquer indício de consciência, os seguintes sinais neurológicos podem ser verificados: movimentos oculares errantes com desvios lentos e aleatórios, nistagmo, transtornos do olhar conjugado, anormalidades dos reflexos oculocefálicos (cabeça de boneca) e oculovestibular (calórico) e ausência do reflexo de acomodação.
Para Paim (1993), o coma, em grego quer dizer sono profundo, é o estado mais acentuado de perda da consciência, que se acompanha, geralmente, de perturbações neurológicas e somáticas gerais. O enfermo conserva apenas a vida vegetativa, estando bastante alterados, de acordo com a intensidade do estado, os automatismos reflexos da vida de relação. No estado comatoso a consciência se acha profundamente alterada ou quando abolida, tanto assim que o enfermo não dispõe da capacidade de se manter aberto ao mundo externo e, desse modo, ter consciência do vivo. Os estados de coma são observados em todas as formas diretas ou indiretas de lesão cerebral.

DELÍRIO ONIRÓIDE – Para Paim (1993), o delírio oniróide é uma síndrome observada no curso de doenças febris, intoxicações crônicas e enfermidades cerebrais orgânicas. Em sua fase de pleno desenvolvimento, caracteriza-se por estes sintomas fundamentais: obnubilação da consciência, desorientação e alucinações. Após uma fase premonitória, de curta duração, em que o doente apresenta mal-estar, sono inquieto, sensações imprecisas, intranquilidade, cefaleia e hiperestesia, surge no quadro clinico a excitação psicomotora. A percepção do mundo exterior está completamente deformada pelas ilusões. As reações afetivas são muito vivas e adequadas ao conteúdo da consciência. O enfermo participa ativamente das cenas produzidas pela imaginação, as quais, geralmente, são angustiosas. O delírio oniróide apresenta-se no curso de enfermidades tóxicas e infecciosas.

AMÊNCIA - A amência ou confusão mental é uma perturbação caracterizada principalmente por turvação mais ou menos acentuada da consciência, acompanhada de fenômenos de excitação psicomotora. É uma manifestação sintomática que se desenvolve de forma aguda com um quadro de confusão fantástica, acompanhada de transtornos ilusórios e alucinatórios, e inquietação motora. O quadro clínico corresponde em grande parte à loucura alucinatória do puerpério. A amência aparece nas doenças infeccionais e evolui para cura dentro de poucas semanas.

ESTADOS CREPUSCULARES - Os estados crepusculares, segundo Dalgalarrondo (2008), são os estados patológicos transitórios nos quais uma obnubilação da consciência (mais ou menos perceptível) é acompanhada de relativa conservação da atividade. Nos estados crepusculares, há, portanto, estreitamento transitório do campo da consciência, afunilamento da consciência (que se restringe a um círculo de ideias, sentimentos ou representações de importância particular para o sujeito acometido), com a conservação de uma atividade psicomotora global mais ou menos coordenada, permitindo a ocorrência dos chamados atos automáticos.
Para Paim (1993), os estados crepusculares são um estreitamento transitório da consciência, com a conservação de uma atividade mais ou menos coordenada. Acompanha-se de falsa compreensão da situação. Em geral, a percepção do mundo exterior é imperfeita ou de todo inexistente. Em alguns casos é possível observar a presença de alucinações e ideias deliroides. A conduta do enfermo durante o episódio pode parecer ordenada, principalmente quando a obnubilação da consciência não é muito acentuada. Costumam desaparecer rapidamente, mas em alguns podem durar muitos dias, apresentando-se e terminando de modo súbito, acompanhando-se de amnesia em relação às vivências acessuais.

ONIRISMO - O onirismo é empregado para designar os estados de sonho patológico, caracterizado pela predominância extraordinária das representações imaginadas sobre as perturbações sensoriais e sensitivas, que são acentuadamente deformadas e amplificadas. No onirismo muitas imagens aparecem como nitidamente alucinatórias, isto é, com uma contribuição sensorial nula, mesmo quando são experimentadas como estéticas. O problema se coloca então na origem dessas estasias. Os estados de onirismo costumam apresentar-se nas perturbações mentais exógenas e na esquizofrenia.

ALTERAÇÕES DA CONSCIÊNCIA DO EU - As alterações da consciência do eu são relacionadas com a identidade pessoal, incluindo-se os transtornos de êxtase, vivência de transformação do eu,

ÊXTASE - O êxtase representa o mais elevado grau do sentimento vital. É a vivência de sentir-se fora-de-si, uma transformação da consciência do eu e da consciência do mundo que, em estado normal, se caracteriza pelo conhecimento das limitações da própria existência pela individualização do confinamento em um corpo e uma consciência individual. Como fenômeno psicopatológico é observado em alguns enfermos histéricos e esquizofrênicos. Na maior parte dos casos de êxtase psicogênico muito contribui para a autossugestão. O êxtase é observado com maior frequência em enfermos histéricos e mais raramente na esquizofrenia.

A VIVÊNCIA DE TRANSFORMAÇÃO DO EU - A vivência de transformação do eu são sentimentos de transformação intima e interna, de metamorfose dos pensamentos e sentimento, como algo vago e indefinido do eu empírico e sente o seu eu mudado ou transformado sobrevém a vivencia de transformação da própria pessoa, que consiste no fato de que o enfermo já não pensa, não sente e nem age como antes, pois experimentou uma profunda mutação de sua personalidade, fenômeno observado no inicio da esquizofrenia. O mesmo pode ocorrer em alguns quadros neuróticos, quando o paciente se queixa de experimentar sentimentos de transformação dos traços característicos de sua individualidade, especialmente durante o tratamento pela psicoterapia.

TRANSITIVISMO - O transitivismo é o fenômeno que consiste em o enfermo sentir-se transformado em outra pessoa. Em psicopatologia, o termo serve para designar as alterações observadas em alguns enfermos, que consistem no desaparecimento da relação entre o corpo e os objetos do meio exterior. trata-se da impossibilidade de estabelecer a distinção entre aquilo que é próprio do individuo e aquilo que pertence ao meio exterior.

POSSESSÃO - A possessão, segundo Paim (1993) é a alteração da consciência do eu caracterizada pelo fato de individuo sentir-se possuído por entidades sobrenaturais, especialmente, espíritos ou pelo demônio. Possui um caráter universal e é explicado em termos de sugestão e como resultado de múltiplos desdobramentos do eu. A crença em espíritos desempenha papel importante no aparecime3nto da possessão, sendo, portanto, através da provocação artificial da possessão, o homem primitivo até certo ponto apossou-se dela para procurar voluntariamente a presença consciente do metafisico, e o desejo de gozar essa consciência da presença divina oferecendo forte incentivo para cultivar estados de possessão. Na clinica, observa-se que a possessão é acompanhada do sentimento de desdobramento da personalidade e se manifesta em sua forma típica no delírio e possessão demoníaca. As manifestações de possessão são encontradas habitualmente nos médiuns espíritas e os casos que chegam ao hospital psiquiátrico estão relacionados com enfermos histéricos e epilépticos. Existem casos de possessão demoníaca em enfermos que havia padecido de encefalite letárgica.

TRANSE - Para Dalgalarrondo (2008) é o estado de dissociação da consciência que se assemelha a sonhar acordado, diferindo disso, porém, pela presença de atividade motora automática e estereotipada acompanhada de suspensão parcial dos movimentos voluntários. O estado de transe ocorre em contextos religiosos e culturais (espiritismo kardecista, religiões afro-brasileiras e religiões evangélicas pentecostais e neopentecostais). Os estados de transe e possessão culturalmente contextualizados e sancionados são fenômenos muito difundidos nas várias culturas em todo o mundo, vistos, na atualidade, como um recurso religioso e sociocultural que permite às pessoas, sobretudo às mulheres, lidar com as dificuldades da vida por meio de estratégias religiosas socialmente legitimadas.

ESTADOS SEGUNDOS - Para Dalgalarrondo (2008) é o estado patológico transitório semelhante ao estado crepuscular, caracterizado por uma atividade psicomotora coordenada, a qual, entretanto, permanece estranha à personalidade do sujeito acometido e não se integra a ela.
Para Paim (1993), os estados segundos é uma alteração da consciência vigil que surge em consequência de acontecimentos desagradáveis. O enfermo vivencia estados de consciência alternantes, correspondentes a duas personalidades distintas: a consciente e a inconsciente ou reprimida, sem que uma conserve lembrança da outra.

CONVICÇÃO DE INEXISTÊNCIA PESSOAL - A convicção de inexistência pessoal é uma convicção do próprio corpo ou de certos órgãos, ou de que o enfermo não se encontra vivo e sim morto. O paciente apresenta uma forma de aniquilamento da própria corporalidade. Encontra-se essa anomalia em enfermos esquizofrênicos ou em casos de depressão grave.

ALCOOLISMO - Os transtornos mentais alcoólicos ou embriaguez patológica observam-se habitualmente alterações da consciência. Nos casos graves, verificam-se a obnubilação muito acentuada, alucinações e impulsos patológicos. No delirium de abstinência alcoólica, além do cortejo sintomático constituído pelas alucinações visuais e táteis, desorientação alopsiquica, ideias deliroides e alterações de humor, notam-se profundas alterações do sensório. A síndrome de Korsakov acompanha-se de ligeira obnubilação da consciência.

EPILEPSIA - Na epilepsia observam-se as alterações características da consciência. A supressão rápida da consciência é uma das mais frequentes formas de inicio da crise generalizada. A ausência se caracteriza, essencialmente, pela perda súbita e momentânea da consciência.

ESQUIZOFRENIA - Nos casos de esquizofrenia, observam-se alguns sintomas típicos como a vivência de transformação do eu. Verifica-se, ainda, no transitivismo, que representa um sintoma de primeira ordem para o diagnóstico da enfermidade.

EXPERIÊNCIA DE QUASE-MORTE – Segundo Dalgalarrondo (2008), a experiência de quase-morte, EQM (near death experience –NDE) é um estado especial de consciência é verificado em situações críticas de ameaça grave à vida, como parada cardíaca, hipóxia grave, isquemias, acidente automobilístico grave, entre outros, quando alguns sobreviventes afirmam ter vivenciado as chamadas experiências de quase-morte (EQM). São experiências muito rápidas (de segundos a minutos) em que um estado de consciência particular é vivenciado e registrado por essas pessoas.

ALTERAÇÕES NORMAIS DA CONSCIÊNCIA - O sono normal. Para Dalgalarrondo (2008), o sono é um estado especial da consciência, que ocorre de forma recorrente e cíclica nos organismos superiores. É também, ao mesmo tempo, um estado comportamental e uma fase fisiológica normal e necessária do organismo. Dividem-se as fases do sono em duas, o sono sincronizado, sem movimentos oculares rápidos (sono NREM), e o sono dessincronizado, com movimentos oculares rápidos – rapid eye movements (sono REM).

O SONHO – Para Dalgalarrondo (2008), o sonho, fenômeno associado ao sono, pode ser considerado uma alteração normal da consciência. É, sem dúvida, uma experiência humana fascinante e enigmática. Os sonhos são vivências predominantemente visuais, sendo rara a ocorrência de percepções auditivas, olfativas ou táteis.

REFERÊNCIAS
DALGALARRONDO, Paulo. Psicopatologia e semiologia dos transtornos mentais. Porto Alegre: Artmed, 2008.
PAIM, Isaías. Curso de psicopatologia. São Paulo: EPU, 1993.


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