sábado, 14 de março de 2015

A PSICOLOGIA NO BRASIL


A PSICOLOGIA NO BRASIL – A profissão de psicólogo foi reconhecida no Brasil por força da Lei 4.119, de 27 de agosto de 1962, que também dispôs sobre os cursos de formação em psicologia. Ao longo desses poucos mais de cinquenta anos de existência, conforme Lane (2006) e Freitas (2009), a profissão se desenvolveu por meio de transformações e mudanças que devem ser observadas para definição do papel da psicologia e do psicólogo no Brasil.
Uma pesquisa realizada pelo Instituto de Pesquisa de Opinião e Mercado (Who), em 2001, revelou que o perfil do psicólogo brasileiro estava representado majoritariamente por profissionais femininas na faixa dos 26 aos 45 anos de idade, tendo a carreira sendo definida por volição e reparação: a primeira ocorre por vocação e busca do uso de recursos para realização da atividade; e a segunda, a escolha se deu para corrigir uma falha na infância. Nesse sentido, detecta-se que a identidade profissional ainda se encontra na busca pela legitimação da ocupação e de engajamento do psicólogo no campo ocupacional. Fatores internos, como realização pessoal, vocação, compatibilidade com as próprias habilidades, gosto e valorização das atividades e dos objetivos realizados pelos psicólogos mobilizam aqueles que escolhem a carreira, bem como os fatores externos, como remuneração, abertura do mercado, visibilidade da profissão e riscos diversos influenciam na decisão na definição da graduação.
A esse respeito, Moura (1999) expressa a existência de uma mobilização pró formação generalista para a área, com o objetivo de formar psicólogos-cidadãos comprometidos com a realidade social, atuando enquanto agentes de transformação, na direção da construção de uma sociedade mais justa e democrática. Tal proposta atua contra a realidade presente de adoção de uma modalidade teórico-metodológica embasada na neutralidade e estabilidade amparadas no mito da universalidade que consideram a concepção de um homem a-histórico e de que todos são iguais em qualquer época e lugar, sob a influência estadunidense das chamadas especialidades atreladas a um campo específico de atuação por meio de uma prática adaptacionista e a-crítica da matriz individualizante. Ocorre que esse modelo entrou em colapso fomentando a crise da Psicologia que se viu com a necessidade de sair das clínicas, despreparada para atender as demandas sociais. Por consequência, viu-se a necessidade de revisão da prática e ampliação da perspectiva de analise profissional, direcionando-se pela ruptura com o modelo biomédico de atuação que privilegia a prática exclusiva ao consultório e prática clínica, evitando-se a leitura psicologizante da realidade, transformando-se para que os sujeitos de desejos conquistem e reinventem a cidadania.
Por essa razão, a principal preocupação estava voltada para as diretrizes curriculares com as propostas do MEC que não ouviu nenhuma representação da categoria, ampliando a falta de flexibilidade do currículo nacional. A base de discussão se encontrava e ainda se encontra na garantia do perfil generalista, detectando, porém, a dificuldade de integração entre a prática e a teoria, notadamente na questão de uma psicologia brasileira que faça frente ao modelo descritivo e reprodutivo adotado. Além do mais, com a emergência globalizante da atualidade, recheada de expectativas de paradoxos, ampliou o conceito de profissionalismo, requerendo especializações e experiência prévia, desde o primeiro emprego até os trainees, tornando a graduação insuficiente para o competente exercício profissional. Destacam Malvezzi, Souza e Zanelli (2010) que uma visão mais acurada do curriculum profissional voltyada para habilitação e potencialidades obsta o acesso do recém-graduado pela exigência de experiência e comprovação de especialização. Assinalam os autores que a habilitação não se configura apenas com o diploma, mas por valores agregados nas competências e na trajetória profissional.
Partindo para a visualização da realidade do profissional no país, observou-se que entre as características dos psicólogos recém-graduados tem-se demonstrado que a razão do interesse pela psicologia encontra-se, segundo Malvezzi, Souza e Zanelli (2010), na viabilidade, na visibilidade, no acesso não problemático e a potencialidade de realização pessoal e profissional oferecido.
As condições de inserção profissional dos recém-graduados, anotados por Malvezzi, Souza e Zanelli (2010), expressam fatores como diversidade de contratos, multiplicidade de vínculos, indiferenciação entre emprego, estágio e trabalho esporádico, remuneração por resultados, competências, atividades exercidas e produtividade, e, enfim, a superposição e a oscilação entre trabalho formal e informal são detectados como os principais obstáculos para enquadramento profissional, levando-se em conta que os empregos são instáveis, migrantes, dinamizados por alta competitividade e com frequentes rupturas na carreira. Tanto que os autores assinalam a atividade autônoma é a modalidade mais encontrada entre os profissionais, seguindo-se de vínculos de atuação nos setores público, privado e ONGS.
Bastos, Gondim e Rodrigues (2010) apontam para as bases do processo de crescimento e interiorização profissional ocorrida na última década, demarcando a mobilidade entre os profissional no país e a origem social desses profissionais, concluindo que a profissão está em constante crescimento tanto nas capitais como no interior, em função da expansão do sistema de formação.
Nesse cenário, observa-se que no cenário da psicologia brasileira, muitas discussões ainda assinalam os mais diversos problemas da categoria. Entre esses problemas há quem aponte que o erro não se encontra apenas no ensino, nem só na falta de flexibilidade do currículo, como também, deve-se destacar, a dificuldade pela descoberta de novas possibilidades de trabalho fora da clínica, da escola ou do hospital, observando-se espaço para a atuação na área da psicologia social e comunitária, penitenciária, jurídica, esportiva, demonstrando a pluralidade profissional com uma riqueza de diversidade de condição e de natureza de trabalho. Como assinalam Malvezzi, Souza e Zanelli (2010, p. 104) que “Ser psicólogo é uma profissão aberta a diferentes caminhos, diversificada para abrigar pessoas de distintos interesses, alicerçada para enfrentar as turbulências da globalização e enriquecida de significativa pluralidade de recursos para ser uma força de transformação na sociedade”, especialmente por ser a profissão que enfrenta as contradições, os conflitos e as desigualdades presentes no contexto brasileiro.
Face tal contexto, faz-se necessário destacar a necessidade de diálogo do profissional psicólogo com equipes interdisciplinares, com capacidade empreendedora formulada a partir do Plano de Desenvolvimento Individual (PDI) e ênfase na pesquisa, tendo uma visão mais ampla da profissão e da descoberta de espaços de intervenção. Também merece destaque o processo de reterritorialização de atividades, pela disputa do profissional psicólogo com outras categorias, a exemplo da área de gestão, reiterando-se a necessidade de especialização flexível e competências portáteis que sejam disponibilizadas nas mais diversas situações da atividade profissional. Em vista disso, convém trazer a expressão de Malvezzi, Souza e Zanelli (2010) de que o objeto da psicologia é o comportamento, seus determinantes e o processo de adaptação do ser humano ao mundo e a si mesmo, como questão presente em todas as atividades humanas, seja na saúde, no trabalho, na educação, na construção de estruturas sociais e politicas, bem como na arte. Um profissional que seja, no dizer de Moura (1999), “[...] capaz de empreender uma prática pluralista, crítica e transformadora, que saiba reconhecer as demandas de intervenção e propor caminhos que atendam a essas demandas. No entanto, para alcançar estes propósitos teremos, inevitavelmente, que transitar por territórios desconhecidos e movediços que, certamente, produzirão rupturas irreparáveis. Entre tantas, destaca-se a necessária e urgente revisão do conceito de saúde mental, da concepção de sujeito, do modelo de sociedade e, consequentemente, da concepção de ciência e métodos de investigação que utilizamos. Depois de tudo, teremos ainda que aprender a relativizar nosso saber acadêmico frente ao saber empírico, a fim de estabelecermos um diálogo produtivo com os sujeitos concretos. Estes, sim, verdadeiros agentes de transformações na realidade sócio-econômico-político e cultural”.

REFERÊNCIA
BASTOS, Antônio; GONDIM, Sônia. O trabalho do psicólogo no Brasil. Porto Alegre: Artmed, 2010.
BASTOS, Antonio; GONDIM, Sônia; RODRIGUES, Ana Carolina. Uma categoria profissional em expansão: quantos somos e onde estamos: In: BASTOS, Antônio; GONDIM, Sônia. O trabalho do psicólogo no Brasil. Porto Alegre: Artmed, 2010.
FREITAS, Maria de Fátima. Psicologia na comunidade, psicologia da comunidade e psicologia (Social) comunitária: práticas da psicologia em comunidades nas décadas de 60 a 90 no Brasil. In: CAMPOS, R.H.F (Org.). Psicologia Social Comunitária.  Petrópolis: Vozes, 2007.
LANE, Silvia. Avanços da Psicologia Social na América Latina. In: LANE, Silvia; SAWAIA, Bader (Orgs,). Novas veredas da psicologia social. São Paulo: Brasiliense, 2006.
MALVEZZI, Sigmar; SOUZA, Janice; ZANELLI, José Carlos. Inserção no mercado de trabalho: os psicólogos recém-formados. In: BASTOS, Antônio; GONDIM, Sônia. O trabalho do psicólogo no Brasil. Porto Alegre: Artmed, 2010.
MOURA, Eliana. A psicologia (e os psicólogos) que temos e a psicologia que queremos: reflexões a partir das propostas de diretrizes curriculares (MEC/SESU) para os cursos de graduação em psicologia. Revista Psicologia: Ciência e Profissão, vol. 19, nº 2, Brasília, 1999.
REVISTA VIVER PSICOLOGIA. O psicólogo, um perfil em construção. 22 de setembro de 2007.


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