O PROBLEMA
DA ATIPICIDADE DOS CONTRATOS MERCANTIS - Inicialmente, convém observar as questões
atinentes aos contratos atípicos que são os contratos que com base na autonomia
privada, são livremente concebidos pelas partes, são chamados de inominados ou
atípicos. Distintos, portanto, dos contratos que têm seus requisitos
intrínsecos específicos, devidamente disciplinados pela lei, ditos, por isso,
nominados ou típicos. A denominação de contratos atípicos é mais apropriada,
uma vez que essa classificação refere-se ao fato de a lei não ter consagrado o
seu tipo. Hodiernamente, o número desses contratos cresce de forma acentuada,
tendo em vista a necessidade de se encontrarem, nas relações econômicas,
fórmulas apropriadas para a efetivação de negócios de todos os tipos, por meio
de esquemas contratuais. Tal fato leva a entender que os contratos empresariais
são tratados também como contratos
atípicos pelo Código Civil. Para o jurista Pedro Pais de Vasconcelos, o
conceito é: (...) os contratos atípicos são os que não são típicos. Saber quais
contratos são atípicos pode parecer simples em abstrato, mas em concreto pode
ser difícil. Quando se fala de contratos atípicos quase nunca se distingue e
quase sempre se está, na verdade, a falar de contratos legalmente atípicos. No
entanto, há muitos tipos contratuais que estão consagrados na prática e não na
lei. Não são poucos os casos de contratos legalmente atípicos, que são
socialmente típicos. Já na visão de Álvaro Villaça Azevedo, “(...) quando o
elemento típico se soma com outro típico ou, mesmo, atípico, desnatura-se a
contratação típica, compondo esse conjunto de elementos um novo contrato, uno e
complexo, com todas as suas obrigações formando algo individual e indivisível”.
Ressalta-se que, frente ao papel desempenhado atualmente pelo contrato, a de
fixar regras claras para ambas as partes contratantes, ele chega a tomar o
lugar da lei em muitos casos concretos na sociedade. Os atuais contratos devem
preservar em seu texto a sua função social, a probidade e a boa-fé objetiva
questões consagradas nos artigos. 4211 e 4222, do Código Civil. Pode-se
destacar que o Código Civil vigente unificou as obrigações civis com as
obrigações comerciais, passando ambas a integrar em seu texto assuntos
pertinentes as duas matérias. Com isto, o Código não refuta a tradição jurídica
mas, beneficia a sociedade ao unificar o direito das obrigações. Dessa forma, o
Código Civil substitui a teoria dos atos de comércio pelo da empresa
tornando-se compatível com a realidade mundial. Dessa forma, com a entrada em
vigor da Lei 10.406, de 10 de janeiro de 2002 do Código Civil, passou a ser
disciplinado, de forma ampla, a atividade negocial, a figura do empresário, bem
como a sociedade empresarial. Nesse sentido, o Código Civil revogou a primeira
parte do Código Comercial de 1850, com a introdução do direito de empresa na
Parte Especial, livro II, no novo Código Civil. Em decorrência dessas mudanças,
o comerciante se tornou um empresário voltado para a atividade econômica,
substituindo-se o tradicional conceito de comerciante pelo conceito de
empresário. De acordo com a nova legislação, a atividade negocial não traduz a
simples prática de atos de comércio, mas o exercício de qualquer atividade
econômica organizada, para a produção de bens ou serviços. Com relação ao
disposto no art. 4253 do Código Civil, pode-se dizer que “é lícito às partes
estipular contratos atípicos, observadas as normas gerais fixadas neste Código”.
A norma em questão é apontada pelos autores como uma das manifestações da
autonomia contratual, a liberdade de concluir contratos atípicos, ou seja,
contratos que não são correspondentes aos tipos contratuais previstos pelos
códigos ou por outras leis, responde, como anteriormente visto, à exigência da
classe empresarial de multiplicação dos negócios. Percebe-se que há omissões no
Código Civil no que tange as matérias contratuais de exclusividade empresarial,
sobretudo com relação a contratos classificados especiais (atípicos) tais como,
os contratos factoring, de franchising, de leasing, a “lex mercatoria”, além dos contratos
bancários, em que se destacam a abertura de crédito e o desconto. Sobre a lex
mercatoria, impõe ressaltar que este contrato tem como função principal
regular a circulação internacional dos modelos contratuais uniformes, não raro
atípicos, elaborados não pelos legisladores nacionais, mas pelos departamentos
jurídicos das grandes empresas multinacionais. Tais empresas controlam a produção e a
distribuição de seus bens nos diversos quadrantes do mundo. Os contratos
realizados nesta modalidade não têm nacionalidade pois, os participantes são de
diversos mercados que têm interesse em comerciar mutuamente. Ressalte-se,
ainda, que atípicos ou inominados são os que ainda não foram regulados em lei. Em
suma, entende-se que os contratos atípicos são constituídos por elementos
originais ou resultantes da fusão de elementos característicos de outros
contratos, que resultam por conseqüência, em certas combinações, em que se
ressaltam os contratos chamados mistos, que aliam a tipicidade à atipicidade,
ou seja, conjugam e mesclam elementos de contratos típicos, com elementos de
contratos atípicos. Quanto à natureza mista dos contratos, Pedro Pais de
Vasconcelos assinala que: (...) o que dá aos contratos mistos uma fisionomia
própria é o fato de não corresponderem a um único modelo típico, e só a esse
modelo típico, que lhes dê um quadro regulativo que permita a contratação por
referência e a integração de sua disciplina. Este fato de não correspondência a
um modelo típico é, no fundo, o que caracteriza os contratos atípicos. E assim
conclui: “dentro do gênero dos contratos atípicos, os contratos mistos são
construídos por referência tipos que foram modificados ou misturados e por
suscitarem problemas próprios de determinação do regime”. Do ponto de vista
legal, embora não haja expressa previsão no ordenamento pátrio, mesmo assim,
como os contratos não são numerus clausus, aplicam-se aos contratos
atípicos as regras destinadas aos contratos em geral e, especificamente, as
regras disciplinadoras dos tipos legais, que correspondem à prestação
principal. Enfim, atípicos ou inominados, dizem-se os contratos que não se
acham especificamente regulados. Estes estão regulados pelas regras gerais,
pela vontade das partes, e por analogia, pelas disposições dos contratos
nominados, no que couber.
REFEREÊNCIAS
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Contrato de Distribuição sem Pagamento Indenizatório, in: Revista dos Tribunais
nº 737, março de 1997, pp.98/111.
BESSONE, Darcy. Do Contrato – Teoria Geral. São
Paulo: Saraiva, 1997. BULGARELLI, Waldirio. Contratos Mercantis. São Paulo:
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COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial.
São Paulo: Saraiva, 2002.
COMPARATO, Fábio. Direito Empresarial. São
Paulo: Saraiva, 1995
DINIZ, Maria Helena. Código Civil Anotado. São
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_____. Teoria das Obrigações Contratuais e
Extracontratuais. São Paulo: Saraiva, 2003.
GOMES, Orlando. Contratos. Rio de Janeiro:
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VENOSA, Sílvio de Salvo. Novo Código Civil –
Texto Comparado. São Paulo: Atlas, 2002.